Esta colectânea de contos de FC destaca-se, não só como o nome indica, por possuir uma selecção de contos europeus, como por apresentar, para cada um deles, um enquadramento histórico e cultural da Ficção Científica no país do autor.

Como em qualquer colectânea, existem contos para todos os gostos e que despertam as mais variadas reacções – contos esquecíveis, alguns apenas engraçados, outros marcantes que conseguem trazer algo de novo ao universo conhecido.

Entre os contos que diria esquecíveis, encontram-se o do escritor checo Ondrej Neff, The Fourth Day To Eternity, que embora seja engraçado se assemelha a um exercício de escrita que poderia ter sido aperfeiçoado em termos de história; ou o do escritor grego Panagiotis Koustas, Athos Emfovos in the Temple of Sound, com pormenores agradáveis, mas que conseguiu chegar ao final sem me cativar nem marcar.

Banal ainda o conto de Andreas Eschbach, alemão – Wonders of The Universe – cuja personagem principal, Ursula, se vê sozinha num planeta, sem meios de subsistência que lhe permitam sobreviver até à chegada de outra nave. Um conto a puxar para o sentimentalóide que por pouco não caiu em dissertações filosóficas.

Transfusion de Joelle Wintrebert, o segundo contribuidor francês, deixou-se uma amarga sensação de surreal que pode ser definida numa só frase – What the Hell?? (para não dizer pior).

Mas deixemos os maus exemplos. Melhorzitos ainda que não espectaculares (na minha opinião) foram os contos de Richard de La Casa / Pedro Jorge Romero (espanhóis), de Lucian Merisca (romena), de Elena Arsenieva (russa) ou de Jean Claude Dunyach (francês)

Jean Claude Dunyach, doutorado em matemática aplicada e supercomputação, escreve o conto que abre a colectânea – The Separations. Do seu currículo constam vários prémios entre eles o French Science Fiction Award. The Separations é um conto engraçado, audacioso e fatalista que não me despertou especial interesse. Do mesmo autor, podem encontrar um artigo sobre a ficção científica francesa em Fantastic Metropolis.

A Birch Tree, A White Fox é o conto de Elena Arsenieva. É uma história relativamente simples mas marcante em que uma nave poisa num Mundo desconhecido para reparações, mas cujos tripulantes cedo se apercebem que proferir sons é uma sentença de morte. Sobre a Ficção Científica russa podem consultar o artigo na Wikipedia.

Da autora romena, Lucian Merisca, chega-nos Some Earthling Adventures in Outrerria. Como o título indica trata-se de uma aventura noutro planeta, que consegue ter alguns toques de genial sarcasmo pelo meio, sem ser no seu todo excepcional. Talvez expandido se pudesse tornar um livro de aventuras singular.

A dupla espanhola escreve em torno de uma possibilidade interessante envolvendo as várias vezes debatidas viagens no tempo- The Day We Went Through the Transition. Sendo possível viajar no tempo, também seria possível modificar a história – se não existisse um esquadrão especialmente desenvolvido para proteger os acontecimentos históricos e garantir que estes não são alterados por terroristas. Uma história eterna.

Em qualidade e ordem crescente, seguem-se para mim, os contos de Valerio Evangelisti, de João Barreiros e de José António Cotrina

Valerio Evantelisti embora italiano, escreve uma história (Sepultura), passada num Brasil futuro socialmente pouco diferente, em torno de uma prisão de presos políticos que são torturados recorrendo a métodos cientificamente evoluídos e, claro, extremamente sádicos. Um conto negro cujo final parece cortado à tesourada.

José António Cotrina escreve Between the Lines, que eu não classificaria como FC, mas como Fantasia que recorda os contos de Zoran Zivkovic ou de Dino Buzzati. Between the Lines é uma questão de perspectiva, de olhar para o mundo de maneira diferente – inicialmente um conto de contornos juvenis que é bem desenvolvido e amadurecido.

A night of the edge of the empire é o conto de João Barreiros. Um conto que podemos encontrar noutras antologias portuguesas ou online no site E-nigma. É uma sátira de humor peculiar que nada poupa, dentro do género do autor, bem construído e que no final nos traz um sorriso irónico /sarcástico aos lábios.

Deixei os melhores para o final, e desta vez sem qualquer ordem – Vertummte Musik, A Blue and Cloudless Sky, Destiny, Inc, Yoo Retoont, Sneogg Ay Noo, Baby Doll.

Baby Doll da escritora filandesa Johanna Sinisalo é uma sátira social bem delineada em torno da futilidade cada vez mais evidente da actualidade. Histórias semelhantes não são raras e consigo recordar-me facilmente de algumas. No entanto, ainda que esta nada nos traga de novo, torna-se arrepiante e marcante pelos detalhes, e pela forma como nos é contada.

Yoo Retoont, Sneogg Ay Noo é um título estranho, mas é a forma como fala uma das personagens do conto. Mark S. Huberath não nos traz marcianos, seres fantásticos ou robots; mas sim um mundo pós-apocalíptico apresentado por uma sala onde vivem 24h por dia, vários seres humanos jovens com fortes deficiências físicas e mentais. A sua aprendizagem é feita através de um ecrã que mostra o que lhes pedem, e que é o único contacto com o meio exterior. Este é sem dúvida um conto que se distingue pela diferença mesmo que no final não me tenha agradado a 100%.

Destiny, Inc é o conto de Sergei Lukyanenko, o segundo contribuidor russo, que escreveu a série composta por Night Watch, Day Watch e Twilight Watch. A história neste livros centra-se em personagens sobrenaturais ou fantásticas já muito exploradas (como os vampiros ou os magos), com um princípio banal (Maus Vs Bons) mas que se torna diferente, tanto pela forma como Lukyanenko molda os acontecimentos, como pelas diferenças no cenário e na mentalidade. Destiny Inc tem algumas semelhanças com esta série de livros. Nada se ganha, nada se perde, tudo se troca – é neste princípio que se baseia o conto, ainda que não estejamos a falar de matéria, mas de destinos. Mais especificamente de uma empresa que nos permite trocar fobias ou acidentes conforme aquilo que nos é mais suportável.

W. J. Maryson escreveu Vertummte Musik. Holandês, o autor esteve recentemente em Portugal para o lançamento da sua trilogia O Não Mago, aquando do Fórum Fantástico. Este é, para mim, um dos grandes contos desta colectânea – um conto original que parte de uma distopia arrepiante (como todas as distopias) e que termina com a tristeza da conformação perante o destino. Ainda que um pouco inverosímel pela reacção das personagens, é para mim um dos contos mais salientes.

A colectânea termina em grande com A Blue and Cloudless Sky de Bernhard Ribbeck (dinamarquês). Num planeta caracterizado por uma reliogidade elevada em torno de uma profecia, a história do Mundo é circular. Mas é principalmente pelo imprevisível desfecho que um conto que poderia ser banal se torna um dos melhores.

Para mim, uma das grandes vantagens deste género de colectâneas é dar-me a conhecer uma série de escritores que doutra forma teriam continuado omissos. Já sei que, de seguida, vou tentar encontrar algumas das suas obras. Para além disso, gostei da introdução a cada um dos contos que nos situa historicamente, realçando algumas das diferenças culturais que algumas histórias transparecem.