Este autor é conhecido sobretudo pelo livro A Guerra das Salamandras, um clássico da ficção científica que apresenta uma guerra entre humanos e outra espécie sapiente no planeta Terra. Um livro curioso, que usa várias formas narrativas para apresentar diferentes perspectivas e o desenrolas dos acontecimentos. Apesar de ser um clássico, não me fascinou na altura em que o li.

Mais recentemente (ou até, há poucas semanas), a editora Antígona publicou outro livro do autor, A Máquina do Absoluto – trata-se de outra narrativa de ficção científica, também de tom satírico, mas que resultou melhor comigo. Neste volume, um cientista inventa um novo tipo de carburador, uma máquina capaz de queimar qualquer matéria e extrair toda a energia que esta contém! Um só grão de carvão poderá proporcionar dias de energia!

Mas esta máquina fascinante tem um efeito secundário perverso. Em torno dela liberta-se um tipo de gás (não identificável) que leva os humanos que o inspiram à mais absoluta rendição à divindade. As pessoas são tomadas por uma presença avassaladora, capaz de realizar milagres e converter qualquer um!

A partir desta premissa, e usando uma personagem principal bastante cínica (e orientada para o lucro) o autor apresenta a desconstrução da sociedade humana, bem como as consequências para a civilização que tal arrebatamento generalizado poderá ter.

A premissa é simples, mas o autor desenvolve-a com mestria, e com uns toques de cinismo (via a tal personagem principal) que são, sem dúvida, um dos pontos altos da leitura. A humanidade, na sua globalidade, convertida a uma religiosidade extrema, não se torna mais caridosa, mais responsável ou mais produtiva – enquanto uns exaltam o seu Deus doando todos os seus bens, outros tentam converter os restantes, levando esta necessidade de conversão até às últimas consequências.

A Fábrica do Absoluto é uma sátira fabulosa e inteligente – sobretudo porque usa uma invenção ficcional para construir vários paralelismos com realidades humanas, algumas passadas, outras em potencial com a descoberta de novas fontes de energia; mas também porque opõe a mentalidade do homem prático com a do homem receoso das consequências de tal máquina. Entre as duas componentes, o autor explora várias religiões e filosofias, sem se debruçar demasiado em cada uma, mas demonstrando os efeitos práticos de cada vertente. O resultado é uma leitura marcante, apesar de relativamente rápida, surpreendente e actual.