Lançado em Portugal pela Secret Society, uma chancela da Penguin (onde têm sido lançados outros livros como os de Holly Black), Eliza e os seus monstros destaca-se pela edição, onde a aba traseira se estende para cobrir o corte frontal. Para além do marcador personalizado, o livro apresenta páginas com pequenos desenhos e sombreados, constituindo um volume visualmente agradável. Em termos de história é, como seria de esperar, YA, apresentando contrastes entre gerações e dramas adolescentes, expostos através de uma escrita fluída.

Eliza é a personagem principal da história. Com bastante jeito para o desenho e imaginativa, criou uma banda desenhada online com sucesso mundial – tanto sucesso que lhe tem rendido avultados valores. Mas Eliza é uma pessoa introvertida, que não gosta de se expor, pelo que apenas a família mais próxima conhece a sua verdadeira identidade como criadora da banda desenhada. Mas mesmo entre estes, os pais não compreendem a dimensão da história que criou.

Eliza é uma geek, sem interesse pela escola ou pelas actividades impingidas pelos pais, mas com um foco elevado nas suas criações. Não é, assim, de surpreender que tenha mais amigos online do que na escola. Pelo menos até conhecer o novo rapaz que parece gostar de O Mar Monstruoso, a banda desenhada que Eliza criou. E claro que não lhe conta o seu segredo, omitindo ser a autora da história.

A narrativa decorre, centrando-se em Eliza e oscilando entre os aspectos fundamentais da sua vida – a criação da banda desenhada e consequentemente, as interações que tem com os amigos virtuais, a par com o relacionamento que progride lentamente com o novo rapaz e as saídas forçadas para o meio da natureza.

Entre estes aspectos fundamentais, a história destaca como a escola secundária pode ser solitária para alguns (especialmente para os que possuem interesses muito próprios ou diferentes), havendo o escape para o mundo virtual onde se encontram pessoas com interesses similares, e havendo, talvez, a perspectiva de encontrar outras pessoas na Universidade. As interacções com os amigos virtuais aqui apresentadas são, sobretudo, positivas e construtivas, sobretudo no circulo mais próximo.

Já o relacionamento com o rapaz vai progredindo de forma tosca, de ambas as partes, notando-se que o rapaz tem um trauma do qual tenta se curar, refugiando-se na criação de histórias. Tal como Eliza, o rapaz sabe bem o que pretende fazer do seu futuro e nenhum dos dois vê utilidade na escola ou no plano curricular.

Para além destes aspectos, a história apresenta as usuais diferenças geraccionais. Com a adolescência e a incompreensão dos pais relativamente às novas tecnologias ou novos hábitos, criam-se barreiras na comunicação e nas interacções. Os pais tentam forçar os seus costumes e hobbies, usando a única forma que conhecem para estabelecer laços afectivos e tentando compensar, de forma tosca, pelas interacções menos bem conseguidas. As intenções são boas, mas nem sempre os resultados são os desejados.

E, ainda que estejamos a ver apenas a perspectiva de Eliza, percebe-se que não existem necessariamente culpados. Existem, claro, diferenças geraccionais e de interesses que provocam bloqueios na comunicação. Eliza, como adolescente típica, já teve algumas interacções menos correctas que fazem com que os pais não saibam como agir com ela. Eles tentam – mas os interesses são tão díspares que apenas dão a Eliza a sensação de não estar a ser vista.

Apesar de algum desenvolvimento cliché (os primeiros parágrafos permitem antecipar as linhas gerais da história) é uma narrativa fluída e bem construída, que tem, a meu ver, dois pontos menos positivos. O primeiro tem a ver com o relacionamento em si, existindo algumas acções mais egoístas e o desenvolvimento de alguns estereotipos. O segundo está relacionado com a forma como Eliza, nas últimas páginas, afinal até gosta de algumas coisas que os pais tentam impingir, mas de uma forma que quase dá a entender que precisava de ser curada.

Para além dos temas abordados na maioria do romance, existem outros com relevância suficiente para serem referidos. Eliza é, também, uma leitora ávida que se interessou pelas sagas fantásticas de outros escritores, havendo, em mais do que um momento, referências a uma autora que não terminou a sua série, afastando-se do mundo após uma grande onda de sucesso. Paralelamente, fala-se do impacto da fama e das expectativas dos leitores e de até onde os escritores lhes devem alguma coisa.

Para além desta componente, encontramos, ainda, a excessiva exposição às redes sociais e a forma de gerir essa exposição e as consequências na vida real de milhares de mensagens, algumas positivas, outras negativas.

Eliza e os Seus Monstros não é um livro perfeito, mas possui uma narrativa de fácil acesso, na qual existem existem vários elementos com os quais é possível empatizar – desde o relacionamento difícil com os pais durante a adolescência, à ansiedade na adolescência, ou à dificuldade em encontrar quem partilhe de interesses semelhantes.

A leitura destaca-se por apresentar uma perspectiva pouco usual, a de criador de mundos fantásticos, cruzando-a com os dramas da adolescência, enquanto apresenta os desenhos associados à realidade criada pela personagem. É uma leitura fluída e aconselhável dentro do género YA.