Vencedor dos prémios Arthur C. Clarke e John W. Campbell Memorial, The Child Garden basea-se num conto curto, Love Sikness que terá ganho também o prémio British SF para melhor história curta.

Em Portugal o livro foi publicado pela Clássica Editora, numa colecção dirigida por João Barreiros, um dos melhores (para mim o melhor) autores de ficção científica português, com livros como A Bondade dos EstranhosA Verdadeira Invasão dos Marcianos ou O Caçador de Brinquedos e Outras Histórias. Tendo lido a edição portuguesa, reparei que peca em dois pontos importantes: a rosa na capa vermelha relaciona-se bem com a história, mas para quem não a conhece, assemelha o livro a um pegajoso romance cor-de-rosa; por outro lado, a encadernação é de baixa qualidade, e os cadernos foram-se separando durante a leitura.

Para além de The Child Garden,  de Geoff Ryman, foram também publicados em Portugal, Ar e O Guerreiro que Trazia a vida, respectivamente pela Gailivo e pela Caminho. Tendo li Ar há pouco tempo, não deixo de sentir algum paralelismo nas duas histórias: apesar de se centrarem em espectaculares avanços tecnológicos, centram-se nas relações humanas e na forma como a tecnologia pode afectar a sociedade e consequentemente os relacionamentos.

Em The Child Garden a esperança média de vida é curta, rondando os 30 anos. Em compensação, são administrados vírus aos bebés que lhes possibilitam aprender rapidamente e ter disponível um enorme volume de informação. Estes vírus recordam a nanotecnologia de se fala hoje em dia – são capazes de reparar tecidos e de actuar como sistema imunitário. No livro, os vírus modulam também comportamentos e memórias, podem ser utilizados para normalizar tendências sexuais ou pensamentos.

Ainda que envelheçam por volta dos 30 anos, graças aos vírus, estes seres humanos aprendem a falar muito mais cedo e amadurecem precocemente, escolhendo uma profissão aos 10 anos. Neste mundo de elevada capacidade tecnológica, os seres humanos sofrem as consequências de uma estrondosas descoberta que terá eliminado o cancro mas terá, também trancado as sequências genéticas. Após a cura descobriu-se que as células cancerígenas tinham um papel fundamental na manutenção da juventudade, estimulando a replicação das células saudáveis vizinhas.

Milena é uma jovem orfã que se destacou desde muito cedo por ser resistente à maioria dos vírus que são administrados aos restantes, tendo recebido, aos 10 anos uma dose demasiado forte que lhe terá retirado todas as memórias do passado. Por ser resistente, Milena nunca foi lida, ou seja,  nunca foi submetida a testes psicológicos com o objectivo de lhe corrigirem as tendências sexuais. Desta forma, mantem-se capaz de se apaixonar por uma criatura do mesmo sexo, mas de espécie diferente, um ser humano modificado geneticamente para se assemelhar a um urso, que escondida na cala da noite, canta belíssimas óperas.

Jardim de Infância explora não só as consequências da busca de uma vivência perfeita, com a descoberta da cura permanente para o cancro; como também o limite da normalização dos seres humanos, em que todos possuem as mesmas tendências e o mesmo conhecimento, tendo-se perdido a capacidade de imaginar e de criar. Em boa verdade, o livro apresenta-nos uma realidade distópica de forma suave em que as vantagens tecnológicas se tornam limitações à espécie humana, barreiras sufocantes à criatividade.

The Child Garden é daqueles livros, raros, em que não se sente a falta de outras personagens ou pontos de vista – Milena é instável e imprevista q.b. para tornar a história interessante, ainda que não tenha simpatizado totalmente com ela.