
Mário Coelho é um dos poucos autores portugueses de ficção especulativa a ver a sua obra publicada no mercado anglosaxónico! Recentemente tivemos a Diana Pinguicha, com a Miracle of Roses, num tom mais fantástico e o próprio Mário Coelho com contos vendidos a algumas revistas. Unto the Godless What Little Remains é o seu primeiro livro publicado, com direito a edição assinada e limitada.
Título peculiar, a sinopse promete uma história carregada de tecnologia digital, entre inteligências artificiais e a internet, recordando outras narrativas de cyberpunk com elementos semelhantes. Diria que a história de Mário Coelho não se enquadra totalmente no género – existe uma evolução social lógica na utilização da tecnologia, mas o desenvolvimento narrativo não se faz à custa de intensos episódios de acção, nem demonstra uma degradação social como é habitual no género.
Mas pegando na tal evolução social lógica, a história desenvolve-se num futuro pouco distante, onde todos estão constantemente ligados, podendo-se construir avatares que parecem agir como a própria pessoa. Em paralelo, a inteligência artificial parece ter atingido um novo estado. Para além das interacções constantes, encontramos a possibilidade de que toda a informação de uma pessoa possa ser exposta – até as conversas íntimas! É neste cenário que a história decorre, levando-nos a acompanhar várias personagens que desenvolvem os seus próprios dramas, ou planos de elevada complexidade.
A história está envolta num humor peculiar, algo irónico – a tecnologia desenvolve-se, mas não deixa de apresentar novas questões. O resultado apresenta uma aura caótica, mimetizando o excesso de estímulo e de interacção, mas não deixa de encontrar a sua própria direcção narrativa. A história tem, portanto, um estilo muito próprio que, apesar de parecer ter alguma influência cyberpunk, consegue apresentar-se como original. Mário Coelho é, sem dúvida, um autor a seguir.