Este é o último volume publicado de Paracuellos, lançado em 2016. Depois de vários volumes centrando-se nos episódios mais drásticos dos colégios internos da acção social espanhola, tal como o sétimo, este volume explora relacionamentos mais íntimos que se constroem na ausência das figuras paternas.

Para quem desconhece a premissa, Paracuellos é uma série de histórias em que o autor conta alguns episódios que decorreram nos colégios internos. O próprio autor terá crescido num deles, contando, por vezes em tom mais autobiográfico, como eram as tareias sucessivas ou os castigos extremos, resultado da insensibilidade de quem deles cuidava.

Nos primeiros volumes assistimos a pesados relatos dos casos mais gritantes. Tareias sem sentido e pequenas felicidades destruídas em rasgos insensíveis (e idiotas) envolvendo figuras infantis de corpo franzino e grandes olhos pasmados. Com a evolução, o autor assume um tom mais próximo e menos alienado da personagem, mostrando essa mesma brutidão, mas concedendo, a cada criança, uma cara e uma personalidade.

Este oitavo volume segue esta evolução, centrando-se no seu relacionamento com alguns adultos. O autor aproveita, assim, para fazer uma homenagem a algumas figuras que aliviaram o quotidiano desgraçado de algumas crianças, terminando com um texto explicativo e emotivo sobre o homem do cinema – alguém que dedicou as suas poucas economias e tempo a melhorar a vida destes meninos.

Na primeira história voltamos a uma problemática já explorada noutras histórias – durante o Verão a água era racionada e os rapazes passavam longas horas em busca de uma gota de água. O que é diferente, desta vez, é que esta busca os leva a encontrar um regador. Como beber a água, mas não ser apanhado? Bem… talvez se possa substituir a água por outro líquido. A travessura confronta-os com um adulto que terá uma reacção que lhes é pouco habitual.

A segunda história confronta o luxo e a opulência de alguns, com as condições miseráveis destas crianças. A comida é pouca e racionada, podendo apresentar proteína adicional imprevista. Mas anualmente o autor, enquanto criança, cria o menú para um banquete onde se recebem altas figuras do estado. Esta criação garante-lhe a presença no mesmo banquete. Por vezes, outros meninos são convidados, mas os critérios para a sua escolha são, no mínimo, questionáveis.

Na terceira história recordamos Antonio Tovar, um dos adultos responsáveis por cuidar das crianças no colégio, conhecido pelas suas filas de bofetadas – por nenhuma razão aparente, as crianças eram dispostas em fila e cada uma levava uma bofetada que os deitava ao chão. Tal acontecia, também, com uma das crianças deficientes que mal se detinha em pé. O volume termina com um dois curtos relatos, um em torno da venda de doces de Antonio Tovar, e outro em torno de um menino que espera de pé, à entrada, todas as manhãs, a vinda da sua mãe, prometida nas cartas.

“Los madres no tienen la culpa”. As mães, essas figuras que, para uma criança, são maiores do que a vida, não têm a culpa do abandono dos seus filhos. Pelo menos, a maioria. Algumas morreram, outras encontram-se internadas em sanatórios. Há ainda as que trabalham de sol a sol e as que não têm meios de cuidar e alimentar os filhos, esperando que, no colégio, possam estudar e evoluir.

Alguns meninos, já não se recordam das suas mães. A sua maioria são figuras distantes. Algumas estão totalmente ausentes. Outras aparecem semanalmente com pequenos mimos e retiram as crianças da escola para as férias. Nalguns casos, até o nome está errado, dadas as circunstâncias do abandono. É a vida. Dura e incontornável que obriga ao afastamento. “Los madres no tienen la culpa”.

Com este volume o autor volta a apresentar uma versão mais empática, explorando menos os factos e dando exposição aos relacionamentos com os adultos. Neste caso, não tanto à maioria dos adultos que se encontram no colégio, mas àqueles que mantém a humanidade e que proporcionam a estas crianças, momentos agradáveis para mais tarde se recordarem. Este volume é, sobretudo, uma homenagem.