Com adaptação para cinema planeada, Uma Estrela de Algodão Preto foi muito bem recebido pela crítica, tendo ganho o prémio Prix Diagonale para melhor álbum e sido finalista para o prémio da BD FNAC. Em Portugal, o álbum foi lançado recentemente lançado pela Ala dos Livros, numa edição cuidada em capa dura que possui, no final, sete ilustrações realizadas por Cuzor.

A história leva-nos à Segunda Guerra Mundial centrando-se ora nos soldados afroamericanos, ora na irmã de um deles que, tendo herdado um diário de uma familiar, vai tentar descobrir a veracidade da história que nele encontra. É que o diário conta a história de uma mulher afroamericana que, sendo ajudante de Betsy Ross, terá incluído, sob uma das estrelas brancas da primeira bandeira americana, uma estrela negra.

Sabendo-se que esta primeira bandeira estava desaparecida mas terá sido recuperada e ostentada pelos nazis, esta parece ser a missão perfeita para os soldados afro americanos que, até ao momento, não eram incluídos em batalhas em missões, por conta da cor da pele.

Centrando-se em personagens afro americanas, é natural que o tema central da narrativa seja o racismo sofrido por afro americanos na sociedade dos Estados Unidos da América. Se a guerra civil entre o Norte e o Sul prometia acabar com a escravidão e, consequentemente, levar a melhores condições a verdade é que continua a existir segregação e discriminação de forma aberta e, até, violenta.

A existência de uma estrela negra na primeira bandeira americana teria um enorme valor simbólico. Por um lado, realçaria que o país foi construído com o esforço de toda a população (incluindo a afro americana), por outro, destacaria que os Estados Unidos da América são o país de todos e não só de alguns.

Na guerra, as diferenças fazem-se sentir, e os soldados afro americanos são mantidos em campos, cumprindo tarefas sem importância bélica ou estratégica. Até ao dia em que ordens superiores destacam três soldados para a missão de recuperação de um bem de importância nacional – a bandeira. A partir daqui, os soldados passam à Guerra propriamente dita e ainda que tenham um objectivo diferente da batalha, acabam por ter de passar por áreas de confronto directo, com consequências pesadas.

Para além da escravidão, da luta de direitos no Estados Unidos e da Guerra, e do racismo, a história apresenta o companheirismo entre soldados unidos por um mesmo objectivo e que devem confiar a vida aos companheiros. Neste caso, trata-se, ainda, da dignidade dos soldados afro americanos que finalmente têm uma oportunidade de provar o seu valor na guerra e que devem cooperar por esse objectivo. Em paralelo, a narrativa alterna entre os soldados e a irmã de um deles (a que descobriu o diário) demonstrando o seu relacionamento.

O visual é sombrio. A maioria das páginas apresenta apenas duas cores, alterando o preto com tons de cinzento ou castanho, ainda que pontualmente possam existir cores ligeiramente mais claras. Esta opção dá um tom escuro e pesado às páginas, o que combina bem com os temas abordados na narrativa.

Entre o contexto da história (a Segunda Guerra Mundial com alusões à Guerra Civil Americana), e os temas abordados, trata-se de uma história de tom sério que consegue, com a alternância entre personagens e tempos, oscilar entre momentos com mais acção, e momentos mais de interacção ou diálogo. É uma história que requer uma leitura atenta e, por vezes, mais pausada, enquanto caracteriza com sucesso as várias personagens e relaciona acontecimentos. Apesar da premissa central fantasiosa, a história apresenta vários episódios de importância história.

O resultado é uma obra excelente, mas de pesada leitura. É uma história que se centra no racismo na sociedade dos Estados Unidos da América, enquanto apresenta a perspectiva afro americana em vários episódios diferentes – perspectiva esta que é dolorosa de percepcionar e que nos confronta com uma realidade bastante diferente, mas verídica.