Tex é uma das mais conhecidas personagens da Bonelli, destacando-se também por ter uma das séries de western mais longas. Publicado originalmente em Itália, já foi lançado em vários países. Por cá, comecei por ler alguns volumes publicados pela Polvo, mas mais recentemente, houve uma colecção Bonelli em capa dura que trouxe alguns volumes neste formato pela Levoir, e vários volumes foram lançados em formato semelhante pela Editora A Seita.
As histórias da personagem Tex vão tendo várias autorias, existindo histórias mais curtas e aventureiras, algumas narrativas mais superficiais mas com capacidade de entretenimento. Mas existem, também, histórias mais complexas que apresentam uma camada interessante de investigação histórica. Uma destas, uma das minhas favoritas, Patagónia, explora os conflitos reais na Argentina, e coloca neste cenário as suas personagens ficcionais. Curiosamente, este Ministrel Show, apesar de diferente em fluxo narrativo, e da mesma autoria de Patagónia, destaca-se também por apresentar elementos reais da época, recorrendo a figuras históricas, sendo a meu ver, também um álbum de referência Tex.



A história começa por nos levar ao rescaldo da Guerra Civil Americana, mostrando como os Rangers se encontram em risco. Tendo existido alguns membros que apoiaram os Estados do Sul, a sua reputação e lealdade encontra-se em dúvida. Em simultâneo, alguns homens não aceitam a vitória do Norte, formando grupos armados que ameaçam populações e eleições.
É neste contexto que um grupo de Rangers, onde se encontra, claro, Tex, se reúne, procurando mostrar o seu apoio pela União. As eleições estão à porta, e um grupo de índole duvidosa procura interferir com as votações, pelo que o grupo de Rangers se desloca à cidade de Lexington para garantir a ordem. Este grupo de índole duvidosa é composto por alguns nomes sonantes como Archie Clemente, ou Jesse James – figuras históricas que aqui são os vilões que os Rangers enfrentam.



Em paralelo, a narrativa mostra como os escravos libertos continuam a ser maltratados e até assassinados, constituindo pessoas com teóricos direitos, mas que, na prática, podem facilmente perder tudo se tentarem ser cidadãos normais, com o seu próprio espaço e rendimento. É o caso de Joey Nelson, que tendo herdado uma pequena fazenda, se vê quase enforcado, não fosse a chegada abrupta de Tex.
Após sobreviver por um triz a este episódio, Joey Nelson decide-se a pegar no banjo, e a fazer-se ao caminho, acabando por se juntar a um Ministrel Show. O Ministrel Show era uma forma de teatro americana desenvolvida durante o início do século XIX onde artistas, maioritariamente brancos, mas pintando a cara de preto, retratavam os estereótipos afro-americanos, entre canções, piadas e danças. Apesar do conteúdo, o Ministrel Show aqui representado era constituído por homens brancos que defendiam os afro-americanos, existindo também outros grupos (sobretudo no Norte) constituídos sobretudo por artistas afro-americanos. Cada vez mais vistos como politicamente incorrectos e por isso esquecidos, estes espectáculos originaram várias músicas famosas.



Em termos narrativos, a história não aborda apenas a perspectiva de Tex, mas também dos dissidentes e do próprio Joey Nelson (de forma mais tangencial) utilizando estas várias vertentes para construir uma visão da época – com alguns toques ficcionais, claro. Ao contrário de outras narrativas de Tex, esta decorre sobretudo nas cidades, onde, apesar de existir lei e ordem, nem sempre os meios são suficientes para enfrentar grupos armados como os de Archie Clemente.
Este Tex aborda todos estes temas, mostrando por um lado como, mesmo depois de terminada a Guerra Civil, o ambiente está instável, havendo alguns grupos que não aceitam o resultado do confronto, e por outro, como a população afro-americana continua a ser discriminada e maltratada, mesmo depois de serem libertos. A narrativa está impregnada de referências, apresentando um cenário e personagens históricos.
