Publicado este ano pela Oficina do Livro, este será dos poucos livros portugueses a poder enquadrar-se nos géneros fantástico e / ou horror deste ano. Mas esqueçam as referências a Poe – ainda que os contos se enquadrem no género horror, os estilos são bastante diferentes.
Das sete histórias apresentadas, algumas poderão classificar-se como banais, outras como excelentes. Mandrágora encontra-se entre as que mais me divertiu, apesar do desenrolar expectável: um agrimensor viaja a cavalo, quando se depara com um enforcado que não seria de origem pobre, mas que se encontra coberto apenas por andrajos. Distraído por este espectáculo, não se apercebe da aproximação de uma velhota, que lhe oferece uma caixa de madeira, que guarda, estupefacto. Chegado à estalagem mais próxima, estranha a recepção e o facto da maioria dos clientes, parecerem de origem pobre, mas de ricas vestes.
Com detalhes sobrenaturais, A Herança recorda histórias de detectives do final do século XIX: Benjamin Walker é um homem banal, possuidor de dois barcos que lhe possibilitam ter uma pequena renda. Surpreso, recebe a visita de um advogado que o informa herdeiro de um desconhecido, cujo nome não poderá conhecer. Ainda que com algum receio, acaba por aceitar as duas caixas que lhe oferecem, dentro das quais se encontram duas réplicas perfeitas dos seus barcos. Mas não é o único herdeiro, e no consultório do advogado cruza-se com um colega de profissão que terá igualmente herdado réplicas de barcos e que lhe propõe trocar temporariamente uma das réplicas. Passado pouco tempo, o barco cuja réplica possui arde, sem que lhe seja possível reclamar o seguro.
Em O Caminheiro conhecemos um conto com semelhanças a histórias populares, em que viajantes destemidos são atacados por uma figura idosa que lhes suga a força vital, e em A Séance acompanhamos um jovem que goza a estadia de um ricaço excêntrico que resolve convidar um famoso médium para uma sessão privada. Durante esta, escuta-se música, e uma das velhotas participantes falece, como resultado de uma experiência desgastante. Ou será que a história por detrás da sessão espirita é menos inocente do que se julga?
A Face Obscura da Lua será a única história em que poderá ser reconhecível alguma influência de Poe: uma história sombria em que um rapaz se transforma todos os meses num monstro, pondo em risco toda a família. É neste cenário de desolação e temor que um médico encontra a família de um grande amigo: uma outrora austera mansão agora descuidada, uma casa sem criados, e um homem que transpira medo por todos os poros.
Ainda que nalgumas histórias haja alguns pontos a melhorar, esta foi uma surpresa positiva no habitual cenário de livros de autores portugueses: sem gralhas de maior, nem recurso a figuras de estilo absurdas ou conversas ridículas. A Herança terá sido o conto preferido, e, não tendo existido nenhum que classificaria como mau, houve um ou outro que diria banais – estão bem construídos, mas não me cativaram.
No final, é um conjunto interessante, que aconselharia aos leitores do género – nem sempre o género horror se resume a impressionar o leitor com sequência de episódios violentos ou nojentos, e este é um desses exemplos, uma característica que é, para mim, positiva.
Está a ser a minha leitura do momento (quando o trabalho não se prolonga até às 10 ou 11 da noite, isto é).
A avaliação por enquanto é levemente satisfatória, mas deixa que te diga que muito me alegra ver um novo português a trabalhar no género e que se possa gabar de ser COMPETENTE. Quando a maior parte dos autores do fantástico português escreve como se tivesse a cabeça cheia de cimento, um Pedro Medina Ribeiro é mais que bem-vindo.
Tenho o livro em casa para ler e tenho muita curiosidade nestes contos.
Mas realmente é bom que mais bons autores se aventurem no género do terror, já que temos muitas poucas leituras nesse campo.
Luís, o último conto é, para mim, um dos melhores do conjunto. Acho que o autor ainda tem a melhorar em termos de história e desenvolvimento, mas tem o que acho essencial, escreve bem – sem exageros metafóricos ou peneiras.
Ana – eu também já por cá tinha o livro há algum tempo, mas ainda que seja terror, é suficientemente leve para passar no crivo de alguém que goste de sherlock holmes / poirot ou contos populares portugueses.
Muito obrigado pela crítica. Também agradeço ao Luís e à Ana os comentários.
De nada 🙂