Eis mais um curioso lançamento pela Sendai Editora – neste caso trata-se de um volume bastante premiado e até adaptado para filme que retrata uma modelo, cantora e atriz que tudo faz para se manter sob a luz da ribalta. Lilico, o nome desta jovem, está em todo o lado – desde filmes a séries, anúncios, programas de televisão e capas de revista. Representante do expoente máximo da beleza, cobiçada por homens e invejada ou admirada por mulheres, Lilico é, de portas fechadas, uma personalidade muito menos interessante do que parece.
Lilico é, na prática, o que o público lhe permite ser. De respostas ocas, Lilico parece ecoar algo mas nunca se mostrar totalmente. A sua beleza garantem-lhe o palco mas é uma personalidade duvidosa, denominada de Mama, que lhe gere a carreira, moldando-a ao seu sonho e controlando todos os aspectos da sua vida.



A jovem é, na prática, uma boneca vazia de complexidade, carente de atenção e carinho, obsessiva na necessidade de se manter no centro, manipuladora mas também manipulada. Lilico é o que querem que ela seja, reflexo da sociedade e do que esperam dela – não de forma consciente, mas insegura e reactiva, simultaneamente forte no que enfrenta para se manter, mas fraca na ausência de complexidade emocional ou psicológica.
A história apresenta-se sob a perspectiva da empregada que tem uma dupla função – cuidar da modelo e reportar o que lhe acontece à Mama. O que é poderia ser uma profissão quase invisível transforma-se algo mais, evoluindo para um relacionamento complexo que oscila entre cuidado, fascínio e raiva. Lilico é uma personalidade depressiva e deprimente que contamina e degrade os que a rodeiam – seja porque, no seu fascínio são capazes de loucuras, seja porque as acções de Lilico têm consequências emocionais. Tudo é extremo.



Mas a história de Lilico possui outros aspectos relevantes. A jovem não nasceu com o aspecto que lhe conhecem agora, tendo-se submetido, por orientação de Mama a várias intervenções e tratamentos – procedimentos cada vez mais intrusivos e dispendiosos, com efeitos secundários e duração cada vez mais curta. Lilico parece estar em vias de se desfazer. Em seu torno ocorrem algumas mortes, que estarão a ser investigadas por um detective, fã de Lilico.
Helter Skelter é uma leitura mais visceral e dura do que parece à primeira vista. Classificado como uma história de horror psicológico, apresenta as exigências de uma profissão de curta duração e alto desgaste. A notoriedade traz decadência, quer pela incessante busca de mais notoriedade, quer pelas acções a que as pessoas se sujeitam nessa busca. Lilico parece não ter existência para além do papel que realiza e toda a sua realidade roda em torno da fama.



Os desenhos acompanham este tom narrativo. Representam beleza e decadência, contrapondo a suposta beleza física com os horrores que se encontram por detrás, num traço cru que destaca a degradação psicológica e física da personagem.
O resultado é uma leitura inesperadamente boa, carregada de ironias e reviravoltas inteligentes. Lilico é o que o leitor fizer dela, espelho da modernidade e da notoriedade, demonstrando as facetas que melhor convém a cada situação.



