Hugo Van Der Ding é conhecido pelas suas curtas de banda desenhada, onde apresenta trocadilhos e histórias mirabolantes, protagonizados por alguma das suas emblemáticas personagens. Em O Lixo na Minha Cabeça reúne várias destas histórias. Já este livro é bastante diferente. Não esperem histórias com desenhos, mas antes uma série de textos de diferentes autores, sobretudo especialistas e divulgadores de ciência, mas também de autores de ficção científica como Bruno Martins Soares e Luís Filipe Silva. A organização não é só de Hugo Van Der Ding, mas também de Luís Corte Real que dispensa apresentações.

O prefácio é de David Marçal, doutorado em bioquímica que se dedica à comunicação de ciência há mais de duas décadas, seguindo-se uma introdução de Carlos Fiolhais, físico, professor universitário e ensaista. Aqui fala de várias profecias de fim do mundo, referindo como … bem… até ao momento todos falharam nas previsões. Pelo menos as previsões que indicavam o fim do mundo para antes de 2023. De destacar uma referência ao bug do ano 2000 que não teve os impactos previstos – para quem trabalha em sistemas, diria que o bug não se concretizou com os devidos impactos porque centenas de informáticos se dedicaram a alterar os sistemas. Sempre é um fim do mundo mais controlável do que o percurso de um asteróide.

Para além da lista de previsões de fim do Mundo, este texto serviu para me actualizar sobre o Big Crunch. Segundo algumas teorias mais antigas, o espaço estaria em expansão mas a velocidade de expansão estaria a desacelerar. Pensava-se que iria chegar a parar, e, consequentemente, começar a colapsar cada vez mais rapidamente, até gerar o Big Crunch e dar origem a um novo Big Bang. Pelos vistos, ainda antes do ano 2000 se chegou à conclusão de que a velocidade de expansão é cada vez maior, pelo que o Big Crunch parece improvável de ocorrer. Pelo meio do texto encontramos, curiosamente, referências a alguns clássicos de ficção científica, como Le Dernier Homme de Grainville.

Seguem-se então os textos de vários autores que vão optando por diferentes abordagens. Alguns escrevem contos ficcionais de possíveis eventos apocalípticos, com combinações hilariantes e interessantes, enquanto outros optam por se cingir a factos, restringir a imaginação e construir textos mais informativos. Entre os primeiros, há histórias excelentes que podem integrar facilmente uma lista de melhores leituras de ficção científica.

Os textos encontram-se divididos em três secções: Fins do Mundo de Origem Humana, Fins do Mundo de Origem Natural e Fins do Mundo de Origem Espacial. Começando pelos últimos, e cingindo-me aos mais interessantes do ponto de vista ficcional, encontramos O Planeta Errante de Bruno Pinto, que começa por nos apresentar o episódio de um canguru que fugiu de um zoológico. Este episódio vai justificar que a turma de uma escola estude corpos celestes, descobrindo que um planeta errante irá entrar no Sistema Solar, podendo ser um potencial perigo. Na prática, tudo se resume à acção inconsciente de adolescente alienígenas.

Já Nuno Camarneiro opta por um apocalipse pandémico com uma doença a provocar comportamentos agressivos, ainda que os detalhes que justifiquem a doença me pareçam estranhos. Em Com um ar de insânia… de Pedro Mota Machado somos confrontados com um planeta Terra com ambiente impossível de respirar, vivendo a humanidade no subsolo. A história é contada centrando-se num operário que, finalmente, vai conhecer a operária de quem gosta. Pedro Ferreira explora, em Oh Fdase, um apocalipse por uma doença semelhante à das vacas loucas, mas em que os atingidos são extremamente felizes – uma perspectiva curiosa que acaba com o mundo como o conhecemos. Há também quem opte por falar de algumas obras de ficção científica sobre contactos com extraterrestres, como Luís Filipe Silva em Breve Tratado sobre os Terrores do Gado.

O Fim do Mundo em Cuecas apresenta um conjunto heterogéneo de textos, em qualidade e direcção. Ainda assim, vale a pena pelos textos mais interessantes, sobretudo pelos ficcionais que optaram por vertentes narrativas mais irónicas, cómicas ou mirabolantes. Tratam-se de textos inteligente, em que mesmo os ficcionais apresentam alguma informação científica- felizmente, e apesar de serem quase todos divulgadores de ciência, não sobrecarregam os textos ficcionais com factos.