Escrito a propósito da comemoração dos 10 anos da existência da editora Escorpião Azul, Muitos Anos a Virar Páginas reúne entrevistas realizadas por Hugo Pinto a vários editores de banda desenhada em Portugal, dando espaço para que estes falem do mercado, da editora e da sua perspectiva de edição. É, por isso, um daqueles livros de aquisição obrigatória para quem gosta de banda desenhada e pretende perceber um pouco mais da vertente de edição.

O livro começa com a entrevista a Jorge Deodato e Sharon Mendes, os responsáveis pela própria editora Escorpião Azul que falam não só de como entraram em contacto com a banda desenhada, mas também de como criaram a editora, como editam os livros e escolhem os autores. Claro que nesta entrevista também se fala da Polvo, na qual o Jorge teve um papel bastante fulcral no início.

De editor em editor, Hugo Pinto vai prosseguindo numa linha condutora semelhante, que se adapta a cada um dos entrevistados, de acordo com a abertura ou com as pistas que cada um lhe vai dando, e, desta forma, revelando alguns episódios inusitados e opiniões mais controversas. Cada um dos entrevistados tem um estilo muito próprio e este transparece na evolução das entrevistas e no tipo de respostas que dão.

Existem entrevistas mais familiares, mais próximas, onde se denota a confiança e a abertura para este tipo de questões. Também existem entrevistas onde as respostas são mais formais, resultando, claro, numa menor proximidade para com os editores em causa.

Poderia falar de cada entrevista em particular, destacando o que me surpreendeu (positiva ou negativamente), mas prefiro fazer antes uma análise mais global às respostas e deixar que seja o leitor do livro a surpreender-se com algumas respostas. De forma global e pouco factual, conclui-se pelas respostas que é impossível ou viver apenas da edição. A maioria dos editores realiza outras actividades, como tradução ou revisão (por vezes para outras editoras) ou tem outros empregos.

O nosso mercado já permitiu o lançamento de maior número de obras, com maior número de exemplares para cada uma. De alguma forma, houve uma quebra no consumo e, ainda que, neste momento, se lancem várias obras ao longo do ano, a verdade é que nem todos os lançamentos são rentáveis. Em contrapartida, Mangá está em claro crescimento, sendo uma opção de vários jovens. Será esta a porta de entrada para leituras mais maduras? Não sei. A título pessoal posso dizer que já ouvi jovens referir que compram Mangá para a ter, não para a ler.

Para além do mercado, pode-se concluir que os editores de Banda Desenhada editam por paixão e interesse, fazendo, por vezes, apostas menos lucrativas mas que resultam em belíssimas edições em Portugal. Como aumentar o interesse e o número de leitores? Como eliminar o estigma em relação à banda desenhada? Alguns editores fazem sugestões interessantes, mas quem tem disponibilidade para as por em prática?