
Nomeado para os prémios Goodreads nas categorias de Primeiro Romance e YA (para além de vários outros prémios para o género), Raybearer foi recentemente lançado pela Editora Desrotina, que nos tem trazido vários livros de ficção científica e fantasia, numa vertente mais leve, sobretudo YA e fantasia confortável. Este é mais YA do que confortável, decorrendo num mundo imaginário de detalhes algo nublados.
A história começa nos apresentar uma criança, Tarisai que vive rodeada de tutores que mudam com uma frequência excessiva. Sem outras crianças para brincar, nem contacto com o exterior, estes tutores ensinam-lhe tudo que precisa de saber, mas não se envolvem emocionalmente, permanecendo frios e distantes, por vezes abertamente receosos da criança. Existe, também, uma figura materna, distante e nublosa que a chama “Feita de mim” e que lhe fala sempre através de outras pessoas, nunca ousando tocar-lhe.
Tarisai deve permanecer na ignorância do motivo da sua criação. Filha de um cruzamento improvável, vai ser incluída no conjunto de crianças que se podem tornar parte do conselho imperial, todas elas com algum poder mágico. O futuro imperador, também ele uma criança, deverá escolher uma criança de cada reino através do Raio. Para que o relacionamento se estabeleça de forma apropriada, a criança escolhida deverá amá-lo. Por cada escolha, o Imperador ganha imunidade a uma forma de morte.
A realidade de Tarisai muda abruptamente com a inclusão no grupo de crianças, estabelecendo fortes laços com uma outra que, tal como ela, viveu de forma mais isolada e foi usada pelos seus pais de forma brutal. Mas o futuro de Tarisai está assombrado por uma ordem que recebeu da mãe – a de matar o futuro Imperador, após conseguir a sua confiança e ser seleccionada para obter o raio.
A história começa por nos apresentar a perspectiva de uma criança que é mantida na ignorância sobre a sua origem, experienciando apenas o isolamento e o medo dos que a rodeiam. Após estes momentos, a narrativa passa a apresentar o receio que a criança tem dela própria sabendo que poderá não conseguir resistir à ordem da mãe. É neste segundo momento que vai conseguir estabelecer os primeiros laços e amizades, ao mesmo tempo que apresenta uma mente aguçada.
Mas a criança vai crescendo e existirão mais duas fases – a de pertença ao grupo de confiança do príncipe que lhe permite uma existência mais enriquecedora, e uma última de busca pelas origens e por respostas que irá ser carregada de desafios e conflitos, pessoais e interpessoais.



A história distingue-se na componente fantástica por apresentar alguns conceitos que não tinha visto explorados antes. Um deles é a imunidade que advém dos profundos laços de amizade e lealdade. O príncipe deve usar o poder do raio para seleccionar representantes das várias regiões, adquirindo imunidade a um tipo de morte por cada ligação.
Cada região possui as suas próprias histórias e costumes, estando unidas sob o Imperador, mas mantendo, até então, a sua unidade. O medo fará com que as novas leis forcem a homogeneidade, uma tentativa de abolição das diferenças que provoca, pelo contrário, sentimentos contraditórios nas diversas populações.
Na realidade, nem todas as regiões existem em pé de igualdade. Existe uma que carrega o fardo das crianças amaldiçoadas que devem ser entregues aos demónios, uma espécie de pacto como The Ones that Walk Away from Omelas não admitido e de origem velada, que origina revoltas e que vai alimentar uma trama para destronar o Imperador.
A narrativa explora temas como a solidão ou o ambiente familiar abusivo na infância, que geram traumas longos que comprometem relacionamentos futuros. No caso, desta experiência similar nasce a empatia e o reconhecimento. Neste seguimento, a história explora a constante necessidade de agradar aos pais, mesmo (e sobretudo) depois de todos os traumas.
Aborda-se também a condição feminina, mostrando-se como, naquele mundo, as personagens são remetidas para o papel de parideiras, podendo ganhar importância se gerarem a descendência. E claro que não serão bem vistas aquelas que ousarem ter um papel diferente – como a personagem principal, obviamente. Ainda assim, a abordagem chega a um compromisso mais balanceado.
O mundo em si possui conceitos interessantes, mas o foco excessivo na personagem principal que, ainda por cima, existe uma realidade confinada ou controlada na maioria do tempo, faz com que seja necessário recolher ao infodump para se perceberem determinados detalhes. Por vezes esta informação é fornecida pelas personagens em longos discursos.
No meu ver, Raybearer é um livro razoável, mas não excepcional. Alonga-se demasiado nas explicações e centra-se numa personagem que, apesar de poder criar empatia para com o leitor, não possui a melhor perspectiva do que está a acontecer naquele mundo. Para além disso, senti que a história possui quatro momentos distintos, que saltitam em forma e desenvolvimento. Neste sentido, é uma história com elementos engraçados a que daria uma classificação intermédia.