Nomeado para o prémio Locus, Mythopoeic e Goodreads, entre outros, este volume de aspecto curioso tem recebido várias menções positivas e constitui o primeiro de uma série fantástica. A premissa é curioso e procurava algo que se afastasse um pouco dos romances com nuances fantásticas que tenho lido. Consegui. Um pouco, pelo menos.

A história apresenta-nos Emily, uma académica que está a construir uma enciclopédia detalhada sobre os vários tipos de fadas (ou equivalentes) nas várias regiões. Este projecto leva-a a uma vila no Norte longínquo, na qual existem relatos de vários tipos de fadas, que parecem distinguir dos tipos já descritos e catalogadas na academia.

Os primeiros momentos centram-se em Emily e na sua habituação à vila, onde consegue, sem se aperceber, ofender directa ou indirectamente, quase todos, ao rejeitar hospitalidade e ajuda. Emily está habituada a interacções mais académicas, e possui baixa inteligência emocional, não percebendo como interagir da melhor forma com os locais.

Estes primeiros, mais pausados e exploratórios apresentam a estranheza do cenário e a forma como Emily tenta ganhar a confiança de algumas criaturas locais, usando estratégias conhecidas e reconhecidas de várias outras histórias com fadas. Neste caso, Emily interage com figuras mais simples, de poucos poderes, mas de comportamento mais previsível.

A dinâmica da narrativa muda com a chegada de um colega, também académico, mas mais extrovertido e charmoso, que gosta de se ouvir falar e que consegue, de alguma forma, maravilhar os locais. Este colega, Wendell, não chega, claro sozinho. Pouco habituado a trabalhar, traz com ele um grupo de ajudantes que farão todo o trabalho pesado, até ao dia em que fogem em grupo, deixando Emily e Wendell com todo o trabalho da investigação.

A interacção dos dois académicos é curiosa e os dois não podiam ser mais diferentes. Onde Emily é desengonçada para com as interacções humanas, Wendell é envolvente e cativante. Já no entendimento das fadas, Emily parece ter acumulado um vasto conhecimento que a faz perceber os padrões lógicos das criaturas, conseguindo desembaraçar-se das mais curiosas situações. E ambos vão precisar várias vezes dessas capacidades ao longo da história.

Existem vários clássicos da fantasia (como Among Others de Jo Walton, Little Big de John Crowley) que pegam nos contos tradicionais que remetem para fadas de interacções estranhas (onde raramente se percebe o que irá originar uma recompensa ou um castigo), incorporando esta lógica inumana. Este volume pega nesses mesmos elementos, tornando-se, quase, um clássico do mesmo género. Quase, porque no final, resolve enveredar num tom mais romântico e menos clássico em construção, ainda que fique nos limites do Romantasy.

Ainda assim, gostei bastante desta história porque, independentemente do romance, pega em várias premissas interessantes e engraçadas. A caracterização de Emily é bastante peculiar, como académica que gosta demasiado da previsibilidade e da investigação, incapaz de ter interacções humanas normais e demasiado focada nos temas que estuda. Já Wendell é o padrão oposto, possuindo artigos menos sérios, um misto entre estudioso preguiçoso e charlatão

A par com a caracterização das personagens principais, gostei da forma como a autora aborda as fadas, com vários elementos reconhecíveis de lendas conhecidas, construindo criaturas de índole alienígena, centradas em si mesmas e nos seus desejos, impregnadas de poderes mágicos caricatos que provocam efeitos que até dão jeito de forma impensável.

A leitura começa por ser mais lenta, da mesma forma que a narrativa apresenta pouca acção, com mais caracterização e menos interacção, mas mais introspecção de Emily. Arranca depois para algo mais mirabolante (mas contido) com a entrada de Wendell, onde a dinâmica se torna mais interessante e fabulosa, desenvolvendo-se com momentos curiosos, mas também estranhos.

Resumidamente, gostei e decerto lerei o próximo. Gostei das personagens e do desenvolvimento das suas interacções, bem como da premissa académica, das dificuldades em estabelecer conexões humanas e das várias aventuras nos reinos fantásticos que, além de contidos em termos de elementos mágicos, obedecem a uma lógica fria e diferente.