Eis um dos mais recentes lançamentos da Secret Society que é conhecia por lançar livros mais YA, alguns de ficção especulativa. Este promete uma sociedade distópica, que cruza elementos de ficção especulativa com horror.

A história centra-se em Freya, uma jovem mais clara do que é habitual nas colónias, que é conhecida como a filha da maluquinha. A mãe terá sido escolhida, tal como tantas outras ao longo dos anos, para ingressar na metrópole, mas, ao contrário das restantes, voltou, muda e grávida. Freya cresceu sem pai, habituada a ter uma mãe com pouco discernimento, compensando-se com algumas familiares próximas que lhe dão algum apoio.

Apesar da pouca sanidade, a mãe é consistente em conseguir transmitir a ideia de que alguém lhe terá feito algo, e em ferir propositadamente a cara de Freya, como uma forma de evitar que venha a ser uma das escolhidas. Esta realidade faz com que Freya seja considerada uma figura estranha, uma pária aos olhos dos da sua idade.

Revoltada com a sua realidade e ambicionando um dia sair da colónia, Freya começa a deambular pelos telhados após o recolher obrigatório, deparando-se com outros que, como ela, se movem nas sombras, que constituirão uma espécie de resistência à ordem imposta.

Mas, quando no seguimento de um assassínio em massa, resolve integrar clandestinamente a comitiva que leva as escolhidas, acaba ela própria entre as que pretendia evitar. Na metrópole, a realidade é controlada por computadores, tendo cada uma delas uma espécie de saldo que nunca pode atingir o 0. As escolhidas integram aqui um programa de recondicionamento mental e físico que as levaria a ser as próximas empregadas de luxo dos poderosos daquela sociedade.

Ainda que a narrativa tenha passagens pesadas (algumas violentas), não diria que o género do livro se enquadra propriamente no terror. A história lida com temas como trauma infantil, violência familiar, abandono, degradação ou violação, apresentando-nos sobretudo no contexto da personagem principal, mas usando também, outras personagens para tal.

Freya cresceu sem pai, e sofre violência às mãos da mãe, apesar de saber que existe uma suposta intenção boa por detrás destes episódios. Sobrevivendo a este quotidiano dia após dia, desenvolve uma raiva que se expressa em momentos chave ou nos pensamentos expressados, fazendo com a narrativa seja algo pesada pela carga negativa que transmite.

Para além disso, a narrativa apresenta a violência sobre os mais fracos, demonstrando como outros na mesma situação podem acabar por contribuir para esse cenário, sobretudo por instigação psicológica dos que se encontram numa posição mais dominante. Os mais expostos (e consequentemente, neste cenário, mais fracos) acabam por ser convencidos a perpetuar entre eles o mesmo género de violência, como forma de se redimirem ou serem vistos de outra forma pelos mais poderosos, revelando a lavagem cerebral que lhes foi imposta.

A violência não é perpetuado apenas ao nível individual. Mas como política social. Fala-se de racismo e de eugenia. Fala-se de transformar as características dos indivíduos para se aproximarem de um ideal esbranquiçado e inerte. Fala-se de controlo de natalidade forçado. Mas também se fala de extermínio de crianças e adultos com o objectivo de recriar uma visão racialmente uniforme do Mundo. Para além do falar, as personagens são submetidas às consequências desta visão.

De forma global, o povo das colónias é controlado pelo controlo dos seus movimentos, contactos e acesso a bens (sejam materiais, seja electricidade) e obrigado a produzir os produtos necessários à metrópole. Mas, os escolhidos para se mudarem para a metrópole não ficam em melhor situação, apesar de poderem ter acesso a outros bens materiais. São também silenciados, controlados e usados – uma realidade que vai, também, apresentar-se pesada e angustiante.

O Segredo das Larvas é efectivamente uma distopia – mas uma que recorre a vários cenários traumáticos para se fazer sentir, expondo diferentes níveis de violência física e psicológica, perpetuados por diferentes actores. É uma leitura onde se sente o trauma e a raiva pela submissão a tais actos, projectando angústia e desconforto no leitor. Não há redenção. Apenas perturbação, tensão e agonia.