Pensei em começar por dizer de que forma este livro me recordou as minhas leituras favoritas. Poderia começar, também, por tocar nos inúmeros aspectos históricos mencionados ou por referir o aspecto da edição portuguesa. Mas A Tapeçaria do Sinai dispensa comparações, seja com outras obras, seja com paralelismos históricos. Qualquer semelhança com a História foi apenas acessória enquanto li o livro.

Imaginem uma história de tom pausado e irónico, centrada numa personagem inteligente. Tão inteligente que consegue irritar todos os seus pares. Na verdade, demasiado inteligente para se conseguir enquadrar na mentalidade medíocre e acomodada da Aristocracia inglesa e de mentalidade tão aberta que rejeita costumes e tradições inexplicáveis, regras de etiqueta ou aquilo que designamos como bom senso.

Estudioso, Strongbow é um gigante, tanto física como psicologicamente, cuja sombra indispõe os seus pares. Irritado pelo comodismo e tacanhez da mente inglesa, opta por sair do país, descobrindo que se adapta melhor à cultura árabe do que à cultura europeia, onde pode viajar nu enquanto realiza estudos académicos.

Como a maioria das grandes obras, a história não se centra apenas numa personagem. Para além de Strongbow acompanhamos um príncipe albanês que dedica a sua vida ao estudo da bíblica, e se desilude ao descobrir quem a escreveu. Para dar sentido à sua própria vida, opta por forjar uma nova versão, mais aceitável pela crença dos homens. Temos ainda um estranho traficante de amas, e um velho que permanece em Jerusalém há séculos, e descreve a forma como interagiu com os vários povos que terão dominado a cidade.

Pela descrição das personagens já devem ter percebido que o absurdo abunda, tanto nos acontecimentos estranhos, como pelos detalhes mais estapafúrdios. As personagens apresentam uma personalidade bastante peculiar, de obsessões estranhas libertas de necessidades monetárias, numa cultura diferente da europeia, de ideais e costumes distintos. O ambiente é calmo e melancólico, concedendo por vezes a impressão de ser impossível escapar à circularidade dos acontecimentos.  Excelente na forma e na concretização, A Tapeçaria do Sinai tornou-se um dos meus livros favorito, uma daquelas obras às quais é difícil apontar qualquer defeito.

A versão portuguesa foi lançada pela Ulisseia e constitui uma boa alternativa às versões inglesas, quase todas esgotadas ou com preços que rondam as sessenta libras.