Depois de um pequeno apanhado sobre a ficção especulativa em Portugal durante o ano de 2015, eis a normal lista de melhores do ano, com algumas estatísticas para enquadramento.

2015 no Rascunhos

Por motivos profissionais e pessoais, durante os anos de 2012 / 2013 as minhas leituras ficaram reduzidas quase a zero. Felizmente, em 2014 voltei a ler a sério, que é como quem diz, mais do que um livro por semana (Retrospectiva 2014). O ano de 2015 foi o ano de retomar o meu usual ritmo com 152 livros (Livros lidos em 2015). Ao contrário do que me é costume, este ano tinha alguns objectivos genéricos de leitura – ler mais autores portugueses, livros em espanhol e mais banda desenhada. Ainda não foi desta que voltei a pegar em livros de nuestros hermanos.

As críticas aumentaram, bem como as visualizações (cerca de 24 000). Dediquei mais tempo à página facebook, renovei antigas parcerias e criei novas. Também me associei ao NetGalley, uma plataforma que me tem permitido receber cópias digitais das editoras de vários e bons livros. Tudo isto justifica uma nova página com os livros recebidos pelas editoras ou pelos autores.

Artigos mais lidos este ano? Não contando os acessos directos à página principal: As cruzadas vistas pelos árabes (no seguimento de várias pesquisas de teor duvidoso sobre refugiados) com 935 visualizações, seguido de Rapariga com brinco de pérola com 453, O Visconde cortado ao meio com 437. Dos artigos recentes, o mais visto foi Aventuras de João sem medo com 183 visualizações e Mar de Afonso Cruz com 177.

Entradas no Rascunhos que mais gostei de fazer?

– Como oferecer ficção científica ou fantasia a toda a gente;

– Favoritos – Lista de autores, séries e livros favoritos;

– Série de links interessantes – Halloween;

Distopias;

Lançamento Da Família e Inventário do Pó;

– Colecção Bang! Saída de Emergência / Colecção 1001 Mundos Gailivro;

– Livrarias: Leituria / Fyodor / Bivar;

– Enciclopédias e Dicionários Fantásticos;

– As histórias circulares de Zoran Zivkovic;

– The Gallery – Fredrik Dahl Tyskerud;

Metas para 2016? Manter o ritmo, investir na área vasta que é a banda desenhada e continuar a dar destaque a ficção especulativa portuguesa.

As Melhores Leituras 

stories of your life

Melhor antologia – Stories of your life and others de Ted Chiang – As histórias presentes nesta antologia partem de premissas simples para transformar de forma considerável a sociedade, tendo, comummente, um de dois pontos como partida: a influência da religião ou o desenvolvimento da inteligência. Na influência da religião encontramos contos centrando-se no poder da escrita judaica, com golems e homúnculos, ou na construção de uma torre de babel que atinge a cúpula celeste. Com desenvolvimento da inteligência encontramos homens tão inteligentes que jogam xadrez com a realidade, ou entidades artificiais com capacidade de desenvolvimento, aprendizagem e sentimentos que nos fazem questionar se podem ser consideradas entidades com direitos e deveres. Estes são apenas alguns exemplos, mas as histórias de Ted Chiang caracterizam-se por serem impecáveis do ponto de vista formal (sem episódios em excesso e contendo apenas o essencial para a história sem quebrar a empatia com o leitor), interessantes em premissa e envolventes.

lightspeed magazine 47

Melhor história curtaThe Day the world turned upside down de Thomas Olde Heuvelt. Quando pensei nesta categoria, foi logo esta história que me ocorreu. E logo a seguir o pensamento “Que lugar comum, escolher logo o vencedor do prémio Hugo!”. Razão pela qual fui rever as antologias e revistas que li ao longo deste ano (e foram muitas). Resultado? Voltei à mesma história. Apesar de ter lido dezenas de histórias apocalípticas em antologias dedicadas ao tema, esta destaca-se.  Sem se preocupar com causas, nem efeitos cientificamente correctos, centra-se numa única personagem que, frente à desgraça mundial, procura apenas a ex-namorada, num cenário de cobardia e incapacidade para com os eventos que o rodeiam, mas simultaneamente coragem louca para rever a pessoa pela qual está obcecado.

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Melhor banda desenhada Locke & Key Vol.5 – Excepcional do ponto de vista visual, muito movimentado e bastante revelador da origem de toda a história, este volume possui uma enorme carga trágica, com episódios bastante violentos do ponto de vista psicológico. A premissa é interessante – uma série de chaves que se encontram numa velha casa de família permitem adquirir diversos e até, assustadores poderes. É possível abrir, literalmente a cabeça para retirar ou adicionar conhecimentos, é possível passar a existir como um fantasma ou viajar para qualquer lado que tenha uma porta – mas estes poderes só se encontram acessíveis a jovens.

martian chronicle

– Melhor ficção científica – The Martian Chronicles – Ray Bradbury – Excelente e com uma pitada de humor típica de Bradbury, apresenta-nos uma série de histórias interligadas do tempo em que ainda se podia sonhar com uma civilização perdida em Marte. Histórias dementes que nos fazem apaixonar por um planeta que não existe, de sentimento nostálgico, satirizando governos e situações – The Martian Chronicles é simplesmente fabuloso com pitadas devastadoras de ironia bem posicionada.

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– Melhor fantasiaO Grande Manuscrito – Zoran Zivkovic – Não fosse um dos meus autores favoritos, este foi o último livro lançado do autor cuja história se centra em… livros. A realidade descrita é bastante semelhante à nossa, mas possui contornos surreais e fantásticos que são percepcionados e estranhados pelas próprias personagens. O próprio escritor alterna entre decisor e peão, numa dualidade interessante que é explorada em várias camadas. Este não é o típico livro de fantasia épica, mas das que li, nenhuma me desperta o sentimento de maravilha como este livro;

insonho

Melhor antologia portuguesa – Insonho. Bem sei que é um conjunto de contos, mas é um conjunto coeso de premissa interessante – monstros do popular português.

– Outras menções honrosas

  • Antologias – Depois de ter lido mais de uma dezena de antologias, não é de estranhar que queira realçar mais uma, Deathbird Stories de Harlan Ellison, um conjunto pungente de contos negros, pesadelos que subvertem a realidade de forma dura, crua e contagiosa, falando de deuses tornados homens e homens tornados deuses de forma pervertida. Estes contos são murros no estômago e não devem ser lidos pelos mais sensíveis;
  • Histórias curtas – Entre as dezenas de antologias e colectâneas lidas este ano é impossível não destacar mais histórias. The Mill de Paul di Filippo foi outra das histórias de que me recordei logo. Criando um mundo bastante semelhante ao The Carpet Makers é complexo e interessante, apresentando várias gerações que afinal fazem parte de uma farsa imperial – um mundo inteiro numa economia de mentira. The Autopsy de Michael Shea é um excelente conto de horror científico que, sem grandes efeitos, consegue criar o ambiente perfeito de suspense. Em Sun’s East, Moon’s West de Merrie Haskell o conto de fantasia transforma elementos conhecidos apresentando uma rapariga que, sendo capaz de transformar palha em oiro, prefere matar dragões. Claro que tinha de me recordar de outro conto apocalíptico – Dark, Dark Were the Tunnels de George R. R. Martin apresenta-nos uma humanidade dividida entre aquelas que ficaram na terra durante um desastre nuclear e se refugiaram no subsolo e aqueles que estavam na Lua – será que quando as duas partes se reencontram se reconhecem como pertencendo à mesma espécie? Soft de F. Paul Wilson é outro conto apocalíptico que se destaca pela exploração da componente humana, apresentando uma doença que liquidifica lentamente os ossos;
  • Banda desenhada – Estas são referências que não irão espantar ninguém: Saga é uma extraordinária série cruzando elementos de ficção científica e fantástico com vários elementos cómicos; Tony Chu explora poderes associados à comida que causam fascínio e asco ao leitor, centrando-se numa personagem relativamente mal disposta; Animal’Z é um volume negro, deprimente e apocalíptico que deixa pouca esperança na humanidade como a conhecemos – talvez com umas pequenas alterações? Finalmente, The Private Eye é uma distopia futurista, deprimente, estranha e cativante, de cores fortes;
  • Ficção científica – foram poucos os livros de ficção científica ou fantasia lidos este ano – li sobretudo contos. No entanto, O Ano do Dilúvio de Margaret Atwood foi uma leitura suficientemente interessante para merecer uma referência. Apocalíptico, acompanha uma seita de naturalistas que passam por loucos numa sociedade degradada e degradante.
  • Autoria portuguesa – As sementes para boa ficção especulativa portuguesa existem. O que não existe é solo para crescerem ou espaço para se consolidarem e crescerem. João Ventura já é um nome constante de diversas antologias e revistas que, desta vez, me surpreendeu com Fogo! na Antologia de Ficção Científica Fantasporto. Urbania – A destilação do absurdo de Carlos Silva também me surpreendeu pela positiva numa compilação lançada digitalmente, Universos Literários. Finalmente, Teddy de João Rogaciano é também uma história cativante que merece referência;
  • Fora de género – À mesa com Kafka é uma divertida compilação de receitas enquadradas numa história contada ao estilo de algum autor conhecido.

Melhoras leituras de anos anteriores

2014

2011

2010

2009

2008

2007

2006