O duo Marjorie Liu e Sana Takeda ficou conhecido sobretudo pela série Monstress (publicada em Portugal pela editora Saída de Emergência). A história destacou-se por vários elementos fantásticos mas sobretudo sombrios. O visual é espectacular, e apesar de ter começado em alta, ao longo da história tenho-a achado demasiado hermética – carregada de referências obscuras, segundos sentidos e duplas traições que são difíceis de seguir quando não se lêem os volumes todos de seguida. Continua a ter pontos muito positivos, razão pela qual ainda não desisti.

Ainda que não tenha terminado de ler, ainda, Monstress, fiquei simultaneamente receosa e curiosa com esta nova série da dupla, The Night Eaters. O que encontrei possui vários dos pontos mais positivos de Monstress, mas numa dinâmica mais relaxada e mais fluída. A construção de mundo não é tão forte, mas auspicia mistérios interessantes de revelar nos próximos volumes.

Mas afinal, então o que é The Night Eaters? Bem, a história decorre na América, centrando-se numa família de origens asiáticas. Os filhos, um par de gémeos, tentam fazer sucesso com o seu restaurante. Já a mãe, dedica-se à jardinagem, parecendo uma reprodução do humor da senhora do filme Kunfuzão (Kung Fu Hustle) – mau humor permanente e cigarro no canto da boca. Para terminar a combinação, o pai é uma personagem mais afável, que tenta fazer a ligação entre a mãe e os filhos.

Quando a casa ao lado desta família permanece devoluta, sem se vender, a mãe decide-se a limpá-la – mas não sem surpresas. À primeira escavadela descobre-se um estranho esqueleto – visão que amedronta os miúdos, mas não a mãe, que continua como se nada fosse. Dentro encontram-se várias bonecas que poderiam ter saído de um qualquer filme de terror. Novamente, a mãe não só permanece como conversa com as bonecas como se as conhecesse.

Entre a postura dura da mãe e a visão americana dos filhos, a história prossegue com pequenas tiradas ligeiramente cómicas – um género de má disposição e tiradas ácidas que balanceiam os pequenos azares que sucedem na vida normal com o excesso de bom humor do pai. Esta combinação permite prosseguir entre cenários decrépitos e assustadores como se nada fosse.

The night eaters consegue entregar uma premissa com elementos fantásticos suficientemente original e diferente para ser interessante, mas sem esquecer o peso da herança asiática. Os filhos sentem o peso das expectativas familiares e tal até é alvo de piada a meio da história por parte de outros jovens de origens semelhantes – um reflexo autoconsciente em que o cliché parece parodiar-se a si próprio.

Ainda que a premissa não seja brutalmente inovadora ou surpreendente, apresentando uma realidade baseada na nossa com pequenas derivações, quer o ritmo da narrativa, quer a integração dos elementos cómicos (e até, de ligeira caricatura) fazem com que a leitura seja agradável, e envolvente, fazendo desta uma das séries mais interessantes dos últimos tempos.