Eis um livro cujo título me despertou atenção, ao mesmo tempo que me deixou reticente. Quem segue as minhas leituras já deve ter reparado para gosto de subversões de contos tradicionais, seja o recontar da história, seja a apresentação de novas perspectivas e abordagens. Neste seguimento, personagens como Jane Yolden, T. Kingfisher, Neil Gaiman ou Naomi Novik (esta última com alguma controvérsia, no meu entender) têm criado variações curiosas e interessantes – porque será que o príncipe beija uma mulher morta no meio da floresta? Será que a princesa, que não conhece o príncipe de lado nenhum, quer casar com este desconhecido? E as histórias que se centram em crianças ou jovens mulheres, não esconderão algo tenebroso? Pois é, nem todas as recriações (ou melhor, poucas) são para menores de idade.

Neste livro, o autor consegue a proeza de transformar os contos de fadas em histórias politicamente correctas onde encontramos as tendências e as referências actuais. Existem influencers, negócios de entrega de comida, trabalhadores explorados e novos modelos de negócio. Não podemos esquecer as poucas oportunidades dos subúrbios, a realidade das princesas do mundo moderno ou o ultrapassar do medo criado por preconceitos.

Os porcos caçam lobos, os lobos compram casas, os meninos que compram feijões são menos idiotas do que parecem, e as meninas que comem a papa de aveia em casa alheia podem ajudar a criar novos e bem sucedidos negócios. Continuam, claro, a haver vilões, personagens invejosas e príncipes idiotas, bem como madrastas maldosas – mas também existem alianças de personagens antagónicas e desenvolvimentos que desafiam os preconceitos comuns dos contos de fadas.

É na combinação de todos estes elementos que a colectânea de histórias surpreende. Quando referi, no início, que o título também me deixou reticente (ao mesmo tempo que interessada) é porque nesta transformação de histórias em politicamente correcto, se cai, muitas vezes, no excesso de moralismo com discursos pesados e chatos. Nada disso acontece aqui. As histórias conseguem ser politicamente correctas, ao mesmo tempo que exploram novos caminhos narrativos e convertem o rumo em desenvolvimentos mais actuais e lógicos – sem deixar, no entanto, de ter elementos cómicos e irónicos, com críticas ligeiras à actualidade.