Premiada com dois prémios Nebula, três Mythopoeic, um World Fantasy (entre muitos outros), Jane Yolen é conhecida por escrever dentro do género fantástico, invertendo alguns dos mais clássicos contos de fadas. Aqui há uns anos li How to Fracture a fairy Tale. Agora comecei a ler uma colectâneia, The Emerald Circus. Este, Lost Girls é um dos contos contido neste volume.
O mesmo título, Lost Girls, foi usado por Alan Moore para construir uma banda desenhada centrada em três personagens femininas de mundos fantásticos – Alice de Alice no País das Maravilhas, Dorothy de O Livro de Oz e Wendy de Peter Pan. Trata-se de um recontar fantasticamente adulto (e preverso) que cruza os mundos fantásticos com traumas de teor sobretudo sexual.
Aqui o mesmo título é usado para algo diferente, mas que também pega em Wendy de Peter Pan. Neste caso, em Darla, uma rapariga de um mundo moderno que, ao ouvir a história de Peter Pan, refila com a falta de igualdade na história – enquanto os rapazes partem em grandes aventuras, Wendy faz a comida e lava a roupa para todos aqueles meninos.
Mas a história é algo mais. Quando, a meio da noite, uma figura vem buscar Darla para a Terra do Nunca, somos apresentados a uma realidade um pouco diferente da idílica. É que, afinal, não existe apenas uma Wendy. Peter Pan vem buscar ao nosso mundo quer rapazes, quer raparigas, mas quanto os rapazes partem em grandes aventuras contra os piratas, as raparigas são deixadas em casa para cozinhar e arrumar.



Pior do que uma separação de tarefas, é a diferença na forma de tratamento. Peter Pan sabe o nome de todos os rapazes. Mas todas as raparigas são chamadas de Wendy (dado que ninguém se quer dar ao trabalho de decorar os nomes das raparigas) e comem apenas os restos, se sobrarem, das refeições servidas aos rapazes.
Darla, filha de advogada, conhece bem o discurso da reinvindicação dos trabalhadores e cedo instiga a uma greve. Uma a uma, as “Wendys” vão sendo convertidas e, entre a procura de reconhecimento e a vontade de participar em aventuras, fazem-se ouvir pelos rapazes e por Peter Pan. Mas o resultado vai ser bastante diferente do esperado, ainda que bastante positivo para o género feminino – é que, afinal, nem tudo naquela história é o que parece.
Com ritmo, envolvente e dinâmico. Lost Girls é uma excelente inversão da história original, adicionando-lhe um lado perverso inesperado e mudando alguns dos papéis. Darla concede, ainda, uma visão mais actual, realçando a forma como se exploram jovens raparigas numa situação precária de absuso. O resultado é excelente!