De George Orwell os livros mais conhecidos são, claro, Animal Farm e 1984, mas o autor lançou muitas outras obras. Tal como os dois clássicos referidos, muitas das suas obras denunciam ou debruçam-se as condições sociais de várias clássicas. Este Tamanhas eram as alegrias é, no original, um ensaio onde o autor fala dos anos de escola e de como durante anos guardou rancor à experiência no colégio interno. Pegando nesse texto, os autores deste livro adaptam-no para o formato banda desenhada de forma competente, acrescentando elementos que facilitam a conversão para o formato ou novas interacções entre personagens.

A narrativa começa com a entrada de Orwell no colégio interno onde a sua realidade se altera bruscamente. Tendo vivido, até ao momento, num ambiente familiar, de alguma protecção e, até, algum luxo, vai deparar-se com austeridade, rigidez e castigos. Não é de estranhar que a mudança de condições o tenham feito molhar a cama nesses primeiros tempos – acontecimento que o transformava em alvo de tareias, como forma de deixar o hábito. Esta entrada irá reflectir a estadia.

Tendo ganho uma bolsa de estudos para poder frequentar a escola, é puxado mais do que os filhos dos ricos ou dos nobres, a quem a disciplina é bastante mais suave. Mas a aprendizagem é dúbia. Mais focada em factos desconexos e memorização do que entendimento, descurando algumas áreas, sobretudo científicas – elementos que lhe permitem, a par com os colegas, participar em competições de conhecimento, mas que não conferem, em si, grandes competências.

A par com a violência da educação (crê-se que umas boas palmadas ajudem na memorização), visualizamos a violência no recreio e percepcionamos um ambiente propício para perpetuar e impor o status quo. Quem é de origens mais humildes não participa nalgumas actividades ou não pode comprar a mesma quantidade de elementos mesmo que tenha dinheiro para tal – para quê que alguém que nunca será nada quer ganhar hábitos demasiado elevados?

Para além deste ambiente perpetuador de diferenças sociais, denota-se que a psicologia do desenvolvimento ainda não tinha influência na educação. Acredita-se nas tareias a torto e a direito, no passar fome e frio como forma de impor carácter. As crianças vivem num quotidiano traumatizante e pouco dado ao desenvolvimento cognitivo. Todo o ambiente recorda, de forma mais leve, Paracuellos de Gimenez, onde o tratamento das crianças é ainda mais horrendo.

Não tendo lido o original, não consigo tecer comparações, mas o resultado da adaptação é uma banda desenhada fluída, sem verborreias, que apresenta o quotidiano no colégio, com interacções e momentos de acção, pela perspectiva da criança que é o próprio autor. A narrativa é perceptível e envolvente, o desenho é expressivo.

Talvez por conseguir criar essa empatia para com a personagem, a impressão da leitura seja a de uma sucessão de injustiças e contradições. Não devemos, no entanto, esquecer que o próprio autor refere ter-se focado nas poucas (e más) memórias que tinha, sendo o resultado reflexo desta perspectiva longínqua. Independentemente disto, é uma leitura excelente e aconselhável.