
Nomeado para o prémio Will Eisner e vencedor do British Comic Award de 2014 para melhor livro, este é daqueles livros que andava para comprar há vários anos e que recentemente adquiri numa promoção brutal. Ainda bem que o fiz, dado que adorei a leitura.
A história começa por nos apresentar um rapaz que, tendo encontrado a sua alma gémea, percebe que, por influência dos deuses, nunca poderá tocar na sua amada. De alguma forma, possuem magnetismos opostos que (ao contrário da teoria) não permitem que se toquem. Este rapaz, contador de histórias que já percorreu o mundo, possui uma história curiosa que vai sendo contada de capítulo em capítulo.



A narrativa vai usando referências comuns a várias mitologias e lendas, para tecer um conjunto de histórias fabuloso, simultaneamente familiar e diferente onde reconhecemos passagens bíblicas (com Abel e Caim ou a Torre de Babel), episódios da Odisseia (com a resistência aos encantos das sereias), às 1001 noites (onde, enquanto convidado, o contador de histórias consegue-se afastar da sentença de morte).
Para além destes elementos conhecidos, a história é uma epopeia fantástica que também apresenta componentes sobrenaturais e místicos diferentes, até estranhos, que envolvem a narrativa em mistério e exoticidade. O mundo foi criado no seguimento de uma competição entre deuses, por capricho e soberba, sendo que o deus maior, que terá criado os outros dois se revela ciumento, quezilento e narcisista. Este mesmo deus revela pouca compaixão, e os humanos que a ele oram e que atraem a sua atenção podem acabar em piores lençóis.



Já a deusa que criou aquele mundo em especial (semelhante ao nosso e onde decorre a maioria da história) parece distinguir-se, rebelando-se por vezes em relação ao deus maior (e enfrentando as consequências da desobediência), enquanto ajuda, como pode os humanos que atraem o seu olhar.
Apesar da tragicidade em alguns momentos (que encontramos no início e nalguns episódios inusitados) a narrativa é balanceada por uma aura de bom humor, com pequenas piadas e elementos curiosos. As personagens vão-se mostrando resilientes e bem humoradas, fazendo o melhor com os elementos negativos que o deus maior lhes dá.



O facto da personagem principal ser um contador permite que histórias apareçam dentro de histórias, sendo que o contador chega a contar um pouco da sua própria. A maioria destas histórias relacionam-se umas com as outras, interligando-se com outras personagens ou com os deuses, com algumas relações inesperadas (outras previsíveis, o que conferiu familiaridade ao invés de aborrecimento, dada a forma como tais relações foram apresentadas).
Este The Encyclopaedia of Early Earth é um livro fabuloso que cruza várias narrativas e várias referências para criar uma história maior e mais complexa, apesar da simplicidade das suas partes. Para quem gosta de mitologias e deuses (como eu gosto) esta será uma leitura essencial.


