Craig Thompson é o autor de dois livros extraordinários de banda desenhada que se encontram na minha lista de favoritos de sempre. Estou a falar, claro Habibi e Blankets. Ginseng Roots é a sua mais recente obra, que li por altura do Verão. Mas há livros, como este, dos quais preciso algum distanciamento para falar deles. Neste caso, é uma obra muito biográfica do autor que pega em vários aspectos, desde as suas raízes e às suas relações familiares, até ao negócio do Ginseng.
A história apresenta o autor, enquanto criança, orientado, principalmente durante as férias, a cultivar, tal como os restantes membros da família, o Ginseng. Curiosamente, estas raízes seriam exportadas massivamente para a Ásia, com grande sucesso. A partir do cultivo, a história apresenta questões familiares, bem como o desenvolvimento das crianças naquelas condições e o escape pela banda desenhada, mas também, as questões económicas e sociais associadas ao Ginseng.



A história centra-se, portanto, nas raízes. Mas nem sempre nas de Ginseng. O autor aproveita para apresentar as circunstâncias económicas, não só da sua família, mas da comunidade em que vivia, que tem, no cultivo a principal fonte de rendimento. Os salários são baixos, a formação é pouca e as possibilidades escasseiam. É neste ambiente que o autor, tal como outras crianças, é levado a participar também, ganhando desta forma, algum dinheiro para a aquisição das primeiras bandas desenhadas.
A banda desenhada funciona aqui não só como motivador para a actividade laboral, mas também como escape. Numa primeira vertente pela apresentação de histórias que se confrontam com a realidade vivida, numa segunda vertente como um afastamento da actividade laboral familiar, com o autor a escolher a carreira de autor de banda desenhada.



O cultivo do Ginseng não é, no entanto, incólume. Por um lado, o autor possui alguma fragilidade nas articulações, fruto, provavelmente das longas horas na apanha da raíz. Por outro, a dependência neste cultivo trará dissabores económicos, quando a realidade se altera, os preços baixam, e o solo, com o uso de diferentes insecticidas, vai deixar de produzir como antigamente.
O autor começa por explorar as suas memórias em torno deste tempos, reconstruindo os momentos. Ainda assim, complementa com várias perspectivas de outros membros da família, o que ajuda a ter uma visão mais abrangente da situação – mesmo no seio familiar, com o irmão que apresenta recordações bastante diferentes em torno do cultivo do Giseng dado que não emparelha com nenhum dos irmãos, e acaba sempre por ser mais controlado pela mãe durante as horas de trabalho.



Nesta vertente mais familiar, o autor explora, também, a forma como os seus livros, de conteúdo mais biográfico, afectaram o relacionamento com a sua família, mas também como é que esta visão afectou as pessoas que o rodeiam. Em paralelo apresentam-se alguns episódios mais tangenciais, relacionados com a educação religiosa que recebeu e os valores conservadores, bem como as diferenças culturais nas famílias da comunidade.
Mas Craig Thompson ultrapassa esta abordagem mais próxima e familiar, obtendo informações e viajando para perceber a história da planta e do seu cultivo. O cultivo da planta tinha obviamente como alvo o mercado asiático, comparando-se os mercados e os produtos produzidos nos dois continentes, com o impacto na economia local – e ainda assim, sendo um produto altamente valorizado na cadeia, pouco faz ganhar os agricultores que nele trabalham e com o cultivo se degradam. Pelo meio ainda se fala da utilização do Ginseng como componente medicinal.



Ginseng Roots não é uma leitura perfeita. Por vezes pouco linear ou ligeiramente saltitante, é uma leitura longa que requer concentração pela sua densidade. O autor explora os vários aspectos, por vezes em simultâneo, criando interligações entre partes diferentes da obra, o que confere um entendimento mais vasto de alguns acontecimentos. Ainda assim, apesar de não achar que esteja ao nível de Habibi, estará entre as melhores leituras deste ano.
