Publicado recentemente em português pela Editorial Presença (com o título Antes que o Café Arrefeça), Before the Coffee gets cold é um fenómeno internacional de vendas. Este volume é o primeiro de uma série, uma espécie de colectânea de pequenas histórias que apresentam uma estrutura e problemática semelhantes.

Toda a acção decorre em torno de um café meio escondido, de traço antigo, sem ar condicionado, mas sempre fresco. O que tem este café de peculiar? À primeira vista nada. As pessoas entram e saem, como clientes normais. Até que alguns se resolvem a testar as viagens do tempo possibilitadas naquele estabelecimento.

Mas estas viagens não são as típicas, protagonizadas através de uma construção científica. Quem deseja visitar outra época, seja passada ou futura, deve sentar-se numa cadeira específica e ser servido de um café especial. Nesse momento, irá ser transportado à data desejada – mas atenção! Não poderá levantar-se da cadeira, nem deverá deixar arrefecer o café. Quando o beber, o viajante retornará à sua época presente.

Esta forma de viajar, mágica e sobrenatural, cruza-se com alguns elementos de mitologia tradicional japonesa, na forma como apresenta um fantasma associado à cadeira – um fantasma que lança maldições a quem tentar tirá-lo antecipadamente do seu lugar. A forma de viajar é, ela mesma, diferente e inexplicável, mas, também, por isso mesmo, inquestionável. As regras existem e, se contornadas, têm pesadas consequências. Porquê? Porque sim.

A premissa das viagens vai sendo explicada e detalhada a cada história, sendo que neste livro encontramos quatro. Quase todas as histórias são melancólicas, demonstrando alguns detalhes das interacções e vivências do Japão – o namorado de uma mulher bem sucedida resolve mudar-se para os Estados Unidos, a esposa de um paciente de Alzheimer pretende receber uma carta que este lhe terá escrito, uma mulher visita do futuro para tirar uma fotografia, e outra resolve-se a ver a filha no futuro.

As viagens, curtas, não alteram o percurso dos acontecimentos, mas as personagens sabendo-o, decidem-se a viajar na mesma. Nem sempre encontram o que desejam, mas quando encontram, fica um sentimento agridoce – uma amargura pelo conhecimento adicional que recebem, um enfrentar de realidade que é, simultaneamente, envolvente e desagradável.

O cruzamento de realidade com esta espécie de magia recorda, tangencialmente, Murakami ou A Polícia da Memória, ainda que o surrealismo e a estranheza sejam mais ligeiros em Before the coffee gets cold. A estrutura do livro é, também curioso, no sentido em que se divide em diferentes histórias, cada uma com o foco numa viagem diferente. São, no entanto, histórias que se relacionam e que decorrem com algumas das mesmas personagens secundárias, que compõem o ambiente do café.

Apesar de ter achado uma leitura agradável e de perceber o sucesso da série, não é exactamente o meu estilo. Usando uma premissa de ficção científica, mas controlada, a história tem uma aura de sobrenatural aceitável pelo leitor comum, que pode ser interpretada como metáfora, proporcionando um lado semi poético no desenrolar agridoce. Ainda, é uma leitura suave de baixa densidade, que vai pegando em elementos de umas histórias para as outras, construindo algo maior e coeso.