De visual minimalista, esta banda desenhada japonesa foi publicada pela espanhola Editorial Gallo Nero que parece ter uma curiosa colecção Mangá. Este volume foi adquirido na Cult (claro, como quase todos os livros espanhóis que vou lendo e comentado aqui).

La Mujer de al Lado apresenta um formato curiosa, sendo uma compilação de várias histórias que decorrem no quotidiano japonês, mas focando-se em personagens economicamente mais desfavorecidas, um lado da sociedade japonesa que estará mais escondido e que aqui é revelado, em episódios, por vezes, demasiado crus.

Ao longo das várias histórias apresentam-se várias personagens deprimidas ou desiludidas com a vida, algumas maltratadas ou usadas pelos seus familiares e, consequentemente, de perspectivas futuras limitadas ou castradas, mantidas em ciclos de pobreza irremediáveis. A figura do padrasto ou cuidador adulto que se torna abusador ou agressivo parece ser uma constante, bem como a existência de mães que facilmente abandonam os seus filhos, de forma a procurarem novos companheiros – uma vertente também apresenta em livros como Sunny.

Algumas destas personagens vivem consternadas com a sua própria condição, por vezes aceitando-a como inevitável, matando sonhos e alegrias, enquanto tentam manter a aparência de dignidade e honra, sob montantes de dívida inacreditáveis. Algumas optam pela humildade, vivendo isoladas ou envergonhadas, outras optam por tentar estabelecer laços físicos (mesmo na ausência de laços emocionais) ou por vias menos honestas para sobreviver.

Independentemente da opção, quase todas parecem encontrar-se em ciclos de pobreza, onde nem as pequenas vitórias são suficientes, mesmo que festejadas. São estes mesmos ciclos de pobreza que parecem provocar as acções irreflectidas e a perpetuação da situação, recordando-me de um artigo que li, há alguns anos, onde, as mesmas pessoas, apresentavam Q.I.s bastante diferentes consoante a época do ano (que ditava o ciclo económico), havendo valores bastante mais baixos quando o dinheiro escasseava. Nestas narrativas não existem caminhos de glória e escalar social, nem vitórias.

Curiosamente, algumas destas histórias poderão possuir traços autobiográficos, com personagens que querem desenhar e criar mangás, havendo sempre algo nas circunstâncias familiares ou económicas que se tornam impeditivos de seguir uma carreira desafogada.

Em termos de leitura, não se trata de uma leitura fluída e cativante, sendo um relato, por vezes demasiado cru das circunstâncias e das personagens. A realidade que retrata é dura, e é apresentada sem juízos de valor (ainda que o leitor possa fazê-los), sendo uma rara visão da sociedade japonesa.