
Aqui há uns aninhos, entrevistei André Diniz. À data, ele ainda não tinha lançado livros como A Revolta da Vacina, Matei o meu pai e foi estranho, ou Entre cegos ou invisíveis, ou os tópicos que abordam teriam, sem dúvida, sido puxados para a conversa. É, também, o caso deste Muzinga, que, apesar dos contornos sobrenaturais, refere-se a história e tradição, com analogias sobre conquista e eliminação de diferenças culturais.
A história começa por nos apresentar um homem de idade incalculável que fala inúmeras línguas. Chegando a um lugar que já conhecia, percebe que a língua que agora falam é diferente. Quando tenta falar o idioma antigamente ali falado é mal acolhido, escorraçado e até preso, percebendo que houve uma conquista e que os conquistados devem falar agora o idioma de quem os ocupou.



Entre caminhos místicos, vemos a personagem a aprender um antigo e estranho idioma, tanto falado como escrito, tendo a forma escrita ramificações sobrenaturais e religiosas, interligando-se com as crenças daquela cultura, e, claro, com o seu passado e com os antepassados – crenças que agora caem no esquecimento e que urge preservar.
Esta abordagem faz com que Muzinga se distancie de outros livros de André Diniz, onde aborda realidades difíceis, mas de uma forma mais dura e directa, que até pode ser caracterizada de pouco positiva, esperando-se decisões mais práticas das suas personagens. Em Muzinga, a personagem, mais madura, parece estar em constante demanda por um caminho mais positivo, confrontando-se com as várias realidades.



Muzinga é uma história onde nem tudo é o que parece, havendo alguns detalhes que se vão percebendo e descobrindo ao longo do caminho e levando a diferentes interpretações. A história rodeia-se misticismo, pegando elementos incertos e sonhadores, ao mesmo tempo que toca em assuntos mais sérios e globais. No final, é um livro de que gostei bastante, ainda que pareça não se enquadrar no padrão do autor.