História de volume único, Vertigeo é um dos muitos lançamentos recentes da Asa, que promete enquadrar-se no género da ficção científica, mas especificamente no sub-género de ficção apocalíptica ou, até distópica (diria, até, ambas). Não sendo uma das melhores leituras dos últimos tempos destaca-se pelo aspecto visual, que usa bem a premissa para tecer duras paisagens.

A narrativa centra-se em Ugo, um supervisor que coordena um grupo de trabalhadores que tem como missão aumentar os níveis de uma torre. O trabalho é perigoso e as condições de segurança são mínimas, fazendo com que vários trabalhadores morram a cada turno. O avanço das obras é reforçado pela presença de guardas, que recolhem os trabalhadores no final de cada turno. Os atrasos são duramente punidos e a progressão dos pisos estará em competição com o de outras torres. No entanto, o atingir de um determinado nível garantirá algum descanso e acesso a mulheres.

O cenário é apocalíptico. Percebemos que existiu algum tipo de desastre nuclear que terá tornado impossível a vida na superfície do planeta. O mundo é inóspito, cinzento e carregado de seres estranhos, até primitivos, que ameaçam, tal como o vento, os trabalhadores no topo da torre.

Já a sociedade, é nitidamente distópica, com uma demarcada estratificação, com os trabalhadores remetidos para uma vivência fechada no trabalho, onde o seu sacrifício e dedicação não são reconhecidos. A hierarquia social é rígida, inquestionável e imutável, sem esperança de se atingir um patamar de melhor conforto.

Neste sociedade, o destino de cada humano é definido por uma estrutura pré-definida, e não existe sequer a ilusão de se controlar o que se vai ser. Os momentos de possível descanso são fornecidos como celebrações de curta duração, algo com o qual sonhar, num mundo onde até a reprodução é controlada. Trata-se, claro, de uma metáfora ao mundo laboral, uma crítica à permanente vivência para o sacrifício e o trabalho.

Neste enquadramento, o ambiente é soturno e claustrofóbico, entre o fabril e a construção, propício a acidentes e mortes, com uma desumanização e desvalorização absoluta do trabalhador. Os mortos ou eliminados são rapidamente substituídos, sem momento para se pensar na perda. Os que ficam são controlados e vigiados ao extremo.

Este cenário permite o desenvolvimento de desenhos que transmitem a sensação típica das alturas, com estruturas industriais e detalhes de arquitectura rígida e megalómana. Quase todas as páginas apresentam-se, portanto, em tons cinzentos que correspondem ao ambiente, com as expressões e posturas humanas a demonstrarem-se, também, rígidas e tensas.

A narrativa é relativamente simples e directa, com uma reviravolta final que não me surpreendeu – até porque o texto apresenta algumas pistas sob o que pode estar a acontecer. Ainda assim, a narrativa fecha, com esta reviravolta, de forma competente, ainda que quebre um pouco a empatia para com as personagens.

Vertigeo apresenta uma história pós-apocalíptica, com a construção de uma sociedade distópica, uma alusão ao eterno quotidiano dos trabalhadores, em permanente sacrifício. É uma história simples, com um desenvolvimento algo esperado, mas que surpreende mais pelo aspecto visual que a acompanha. E nessa vertente, é uma banda desenhada que vale a pena, apresentando cenários interessantes.