


The City of Brass foi o primeiro livro da autora. Nomeado para vários prémios, recordo-me de ver o livro em várias páginas e blogues, com críticas positivas. Tratava-se do primeiro volume de uma trilogia, seguindo-se a este The Kingdom of Copper e The Empire of Gold. Os volumes seguintes parecem ter passado mais despercebidos, mas também foram bastante aclamados pela crítica. Em 2020, foi anunciado que a trilogia seria adaptada para o formato de série televisiva para a Netflix.
Pertencente ao género fantástico, esta trilogia traz alguns elementos próprios que, julgo, serem a base do seu sucesso. Um deles é a influência do médio oriente, nomeadamente o usar as criaturas mágicas conhecidas como génios (ou Djinn em inglês). Este factor terá influenciado o sucesso de outros livros como The Golem and the Djinni de Helene Wecker, também o primeiro de uma série, nomeado para o Nebula e World Fantasy. Este ainda não tive oportunidade de o ler, ainda que esteja na estante à espera – o segundo volume saiu oito anos depois, ao contrário de The Daevabad que é, neste momento, uma trilogia completa.
Outro factor determinante será, sem dúvida, o tratar-se do primeiro livro de uma autora. Apesar de alguns defeitos menores, apresenta uma boa coerência geral, um bom ritmo e uma personagem principal, Nahri, com defeitos e virtudes, o que a faz ser alvo de fácil empatia pelo leitor. O primeiro volume alonga-se para além das 500 páginas, e talvez pudesse ter alguns cortes, mas, globalmente, apresenta um bom nível para primeiro livro.
Para além de uma boa personagem principal, a história apresenta capítulos com outras perspectivas, o que permite diversificar a visão dos acontecimentos e criar empatia com outras facções dos conflitos – perceber os dois lados (ou mais lados) de uma teia política, as motivações e os planos que tecem para tal. A trilogia começa como uma vertente relativamente simplista das relações políticas, com Nahri a entrar numa cidade milenar carregada de traições e alianças obscuras. Com o decorrer das páginas e o passar dos anos, vamos sendo cada vez mais expostos à densa trama política.
Mas a história não se foca só nesta vertente, e apresenta, também, vários episódios de intensa acção. Acordos e desentendimentos, encontros e desencontros, os confrontos políticos têm repercussões na cidade, com manifestações, execuções, assassinatos e exilados. Isto porque na cidade existem vários tipos de criaturas mágicas (e ainda que de origem semelhante, apenas alguns são chamados de Djinni), cada uma com diferente alianças e forças políticas. O ódio entre as facções é milenar, com rotatividade nas chacinas cada vez que uma sobe ao poder, eliminando os governantes e toda a família da anterior.
E é neste ambiente de cortar à faca, sob o comando de um rei implacável, que a autora escolhe focar a perspectiva em personagens que, como nós, desconhecem todos os detalhes políticos, e tomam decisões incorrectas – Nahri, que chega à cidade no primeiro volume, o príncipe mais novo que não cresceu naquele ambiente, e Dara um guerreiro muito antigo que esteve ausente da cidade durante vários séculos.



Mas a trilogia não é perfeita, claro. Apesar da capacidade de impor velocidade e expectativa (fazendo-me ler os três volumes de uma rajada), existem alguns aspectos menos positivos. Existem pequenas incoerências ainda que a história no global seja coesa, com alguns detalhes por explicar. Existe, também, uma centralidade absoluta nas personagens principais, fazendo com que a maioria das acções e dos poderes lhes sejam atribuídos ao longo da narrativa. As personagens principais são nitidamente mais dinâmicas e apresentam a sua própria evolução, sendo que as restantes personagens são praticamente estáticas, com o mesmo tipo de interacção – só se notando diferenças no último volume, após a guerra.
Em termos de narrativa, a história também não apresenta personagens muito dúbias. Nahri é originalmente uma ladra, mas fá-lo para sobrevivência. Ali, o príncipe mais novo, é um homem criado fora da corte com crenças muito fortes e que age sempre da forma correcta. Dara é um guerreiro que cometeu atrocidades seguindo ordens, mas sempre acreditando estar a fazer o correcto para a sua tribo. Nesse sentido, as personagens poderiam apresentar mais conflitos morais que as tornariam mais reais.
Em termos globais trata-se de uma boa série de fantasia que não chega ao nível do extraordinário, mas que flui excepcionalmente bem. A narrativa é movimentada, com bons suspenses no final de cada volume, levando-nos a querer saber o que acontece a seguir. Existem alguns detalhes expectáveis e alguns elementos que poderiam ter sido limados, mas a trilogia resulta bem em cativar o leitor.