Vencedor do prémio Hugo, este primeiro volume de uma trilogia possui elementos de fantasia e de ficção científica. O mundo construído é curioso, bem como a mitologia – mas alguns episódios são atabalhoados e a narrativa precisava de uns cortes. Sem ser excelente, a história conseguiu manter-me interessada até ao final, ainda que algumas reviravoltas pareçam algo forçadas.

O Mundo

A narrativa desta série decorre num mundo diferente do nosso – um mundo com uma intensa actividade sísmica que tem provocado longas estações de frio. Após a erupção de grandes vulcões surgem Invernos que se alongam por décadas. Após cada longo Inverno, as civilizações renascem, com novas estruturas e regulamentações.

A actividade sísmica aumenta e aproxima-se um novo Inverno. Por esse motivo, todas as vilas e cidades accionam as regras milenares que mal compreendem, mas que sabem poder garantir a sobrevivência. Desta forma, acumulam-se alimentos que possam manter-se comestíveis por longo período.

Num mundo em que vários Invernos trouxeram a quebra total da civilização, existem inúmeros artefactos incompreensíveis, mitologias quebradas e segredos por descobrir.

As criaturas

Neste mundo existem pessoas capazes de controlar a actividade sísmica. Os Roga (como são chamados na gíria) podem ser muito poderosos. Mas apenas quando conseguem controlar os seus poderes. Esta capacidade leva-os a ser, simultaneamente, os elementos estabilizadores de sismos, mas também, os causadores de muitas desgraças. Por esse motivo, eles são perseguidos nas vilas comuns, onde só há lugar para trabalhadores numa hierarquia fixa.

Mas o poder dos Roga tem de ser controlado de alguma forma. Para tal, existem os guardiões. De poderes estranhos, são responsáveis por manter os Roga em ordem e despachar qualquer um que mostre não ser capaz de se controlar.

De destacar, também, a existência de comedores de pedra – umas entidades misteriosas que apresentam uma forma humana apenas para conforto dos restantes. Capazes de atravessar paredes, têm interesses próprios que são, por enquanto, incompreensíveis.

A narrativa

Capa da edição inglesa

A história oscila entre diferentes tempos. Esta percepção vai sendo clarificada ao longo do livro, sendo que inicialmente pareça apenas uma alternância entre personagens e perspectivas. Em cada linha temporal a história centra-se numa Roga e a forma como é acolhida em diferentes comunidades.

Uma criança pode ser, simplesmente, morta, vítima do receio em relação aos seus poderes. Ou pode ser quase abandonada e ostracizada pela família enquanto se chama um guardião para a levar para uma academia de Rogas. Aí será treinada, sob a supervisão dos guardiões, para conseguir controlar os seus poderes. Mas esta academia é, também, uma forma de controlar e de vender os serviços dos Roga.

Poucas comunidades irão gostar da presença de um Roga. Mas não quer dizer que não existam. Existe quem perceba as vantagens de ter alguém a controlar a actividade sísmica e aprecie a sua presença. Mas existem demasiados com medo e que agem agressivamente com base nesse medo.

Ainda que cada linha cronológica tenha interesse e provoque envolvimento, a narrativa possui algumas coincidências pouco limadas que quebram, por vezes, a crença nos acontecimentos. Esta componente torna-se irritante principalmente quando percebemos que seria possível apresentá-los de forma mais coerente com pequenas alterações.

Adicionalmente, há momentos em que as personagens parecem juntar-se numa demanda de forma, também, algo forçada. Existe, no entanto, sempre uma boa tentativa em explicar a cooperação, mas nem sempre esta me parecem convincente.

Conclusão

Apesar destes pontos negativos, Quinta Estação tem muitos pontos positivos. O mundo é interessante e estou curiosa para perceber como a autora irá explicar a interligação das diferentes vertentes neste mundo – Roga Vs Guardiões Vs Comedores de pedra. Ainda, existe evolução das personagens e a autora consegue, de forma competente, criar um puzzles para o leitor ir montando lentamente.

A narrativa tem, sem dúvida, preocupação em mostrar personagens de diferentes raças e sexualidades, aproveitando o desenrolar dos acontecimentos para tecer paralelismos em torno de situações de preconceito e racismo.

Não falta, claro, quem deseje poder e, para tal, será necessário controlar outros. Algumas motivações ainda são desconhecidas, faltando esse ponto importante para ter uma boa percepção da coerência narrativa.

Ainda que, nas primeiras páginas, a leitura tenha sido lenta, com a interligação de algumas linhas cronológicas, aumentou-se o interesse na leitura e nas personagens, levando a que o ritmo na leitura aumentasse. Não é a melhor leitura do último ano, mas está bastante acima da média.

Quinta Estação, de N.K. Jemisin, foi publicado em Portugal pela Relógio D´água.