Na capa
Havia uma capa a tentar chamar a (tua) atenção no meio de tantas outras capas bem mais vistosas. Armada de uma humilde impressão a preto sobre fundo branco, tentava sobreviver à exigente peleja editorial, no confronto com as outras capas plenas de filetezinhos dourados, tipografias moderninhas e exclusivas, cores garridas, imagens de corpos seminus ou pelo menos tratados no Photoshop, efeito 3D e todos aqueles feixes de luz. Os feixes de luz, sobretudo, eram difíceis de superar.
Havia uma capa a tentar chamar a (tua) atenção no meio de tantas outras capas bem mais vistosas.Mas já se sabe, no amor, na literatura, nos embrulhos dos presentes e nos chocolates com recheio, o que conta é o que está lá dentro.
As duas curtas histórias presentes na capa do livro são dois bons exemplos da escrita que vamos encontrar no interior – pequenas histórias engraçadas mas bem contidas, todas iniciadas com a palavra Havia.
Com pequenos trechos, no final de cada história, que sintetizam o episódio e lhe conferem uma pequena reviravolta, é uma leitura rápida, mas agradável de forma pouco usual, jogando com palavras, trocando os seus conceitos por imagens ou objectos materiais.
Havia um poeta que era mais alto, que era mais bem maior do que os outros homens. Então escreveu um poema sobre um banquinho, para que outros homens mais baixos pudessem também elevar-se, e chegar a poder amar assim – perdidamente.
Jogando com ideias, utiliza, por vezes, a disposição da própria pontuação gramatical para contar uma história e expor a transfiguração de uma ideia comum. O livro é, sobretudo, imaginativo, contendo nas pequenas histórias aquela espécie de absurdo cómico que é simpático e agradável – um mar de ideias.