É nos países mais ricos em matérias primas que reina a pobreza e a guerra. A ganância corrompe e molda os governantes, mesmo os que prometem melhores condições para o seu povo. Mas estas promessas mais não são do que engodo para convencer ao voto. Não é de estranhar que Myanmar ou Birmânia (país rico em jade, gemas, petróleo e gás natural, entre outros) siga o mesmo caminho.

Entre 1962 e 2011, o país esteve sob uma ditadura militar que comandava directamente os negócios, as notícias e a produção fabril. A grande maioria destes foram nacionalizados. Qualquer tipo de descontentamento, seja sob a forma de manifestações, seja a simples expressão a um conhecido, são reprimidas com prisão, tortura e balas. A realidade das pequenas tribos étnicas é ainda mais dura, sendo facilmente escravizados ou violados.

As personagens principais deste livro, Thazama, Moonpi e Kim, pertencem à tribo Zomi, forçada a viver em constante escravatura e tortura. Identificados como resistentes ao regime, são obrigados a fugir do país, em busca de liberdade e de uma fonte de rendimento que lhes permita libertar a restante tribo. Mal sabem que o que vão encontrar é um pesadelo de fuga constante.

Atravessar a fronteira não é fácil. Tem de se pagar a criminosos que fazem essa passagem em clandestinidade. Caso algo corra mal, é mais fácil desfazerem-se dos que transportam, do que enfrentar as autoridades. Mas estes criminosos, para além de pedirem quantias avultadas pelo serviço, ainda vendem quem os contratou, como escravos em serviços pesados, onde as vidas são facilmente desconsideradas. É mais fácil pedir um novo conjunto de escravos do que alimentar os que já se tem.

Escapar não é fácil, mas mesmo quem o consegue, não irá encontrar facilmente um novo lar. Os países que rodeiam a Birmânia não são simpáticos com refugiados – pessoas sem papéis (que lhes são repetidamente negados) que aceitam realizar qualquer tipo de trabalho em troca de pequenos valores. De país em país, fragilizados pela sua condição de refugiados, são novamente perseguidos, aprisionados e torturados, num ciclo que parece não ter fim.

Entre a ditadura militar no próprio país, e as perseguições e escravatura nos países vizinhos, o número de mortos é infindável. Alguns são contabilizados. Outros nem por isso. O foco é, no entanto, conseguir chegar a um país europeu, aos Estados Unidos da América ou à Austrália. Ou, pelo menos, conseguir captar a atenção da imprensa estrangeira.

Burmese Moons pretende contar a história das pessoas que morreram neste regime, onde um par de galinhas tem mais valor que uma vida humana. A par com as mortes (algumas frias e abruptas, outras lentas e miseráveis, mas demasiadas, sem sentido) estes refugiados vão sofrendo um processo de desumanização impiedosa: alvos de chacota pelo mísero destino, escondidos pelos governos, expostos e capturados em políticas nacionalistas (alimentadas por notícias falsas.

Visualmente é uma banda desenhada que vai apresentando diferentes tons, começando com a representação de uma existência pacífica e associada à natureza, e passando a páginas mais pesadas, carregadas de violência realista. Ainda que o desenho não seja perfeito nas expressões consegue transmitir o peso das situações, bem como os sentimentos das personagens.

O resultado é pesado – tanto pela violência física, quanto psicológica. Mas é uma leitura necessária para se compreenderem as motivações dos que procuram asilo noutros países