Eis uma série de banda desenhada que se encontrava na minha wishlist há algum tempo. Entretanto houve a oportunidade de adquirir a série num volume único e eis. Tal como prometia, é uma história pesada e dura, que decorre no interior americano – mas ainda assim surpreende pela perspectiva e execução.

A história

A história leva-nos a uma cidade americana que teoricamente não existe. Habitada por criminosos, é um género de refúgio, inexistente para satélites, encoberto por ligação a entidades importantes. A cidade é comandada pela presidente da câmara, uma mulher dura que colocou o filho autista como carteiro – nesta cidade sem contacto tecnológico com o resto, o correio ainda é algo corrente.

A narrativa é-nos apresentada, portanto, na perspectiva do carteiro, Mark. Extremamente inteligente mas pouco perspicaz Mark foi diagnosticado com Aspenger e é subvalorizado pela mãe. Até ao dia em que é raptado pelo pai que, acreditando nas suas capacidades, o deixa quase como morto, pendurado numa árvore.

Crítica

Após a leitura descobri que o autor é o mesmo de Symmetry, e ainda que esta série não me tenha cativado (parei logo no primeiro volume), Postal foi uma leitura brutal. A perspectiva de um rapaz com Asperger no meio de uma cidade de criminosos começa por mostrar um jovem desintegrado da sociedade, isolado e, até ridicularizado.

Mas após a intervenção do pai, o jovem direcciona a sua inteligência na aquisição do que quer, mostrando que as suas capacidades peculiares o podem transformar num adversário caricato mas a temer.

É Mark que conta a história, fazendo com que em todos os momentos, sejamos expostos à sua forma peculiar de pensar – é difícil perceber emoções e segundos significados em frases, mas os seus sentidos são extremamente apurados e é muito fácil identificar alguém mesmo quando está mascarado. Mark decide-se a querer alguma coisa, e sendo a sua empatia bastante baixa, o resultado é um pensamento mais lógico e analítico.

A história tem vários episódios de violência. Ainda que menos gore que outras séries de banda desenhada como The Boys, ou The Preacher, numa cidade carregada de criminosos que têm de se conter, não é admirar que surjam picos de violência – catarses com graves consequências. Mas a maior extensão da história é no desenvolvimento de conflitos e na criação de tensão.

A história move-se, portanto, pelos sucessivos conflitos. Há quem queira tomar o poder sobre a cidade. Há quem queira chantagear, ou quem queira simplesmente dar espaço aos seus ímpetos assassinos – algo proibido naquela cidade. Mark vai assistir a alguns destes jogos de poder e vai-se envolver nalguns.

Para além de Mark, assistimos, por vezes, a alguns episódios na perspectiva de outras personagens. São raros, e mostrados como num filme, sem acesso ao pensamento dessas outras personagens ou das suas verdadeiras intenções. Mark torna-se, progressivamente numa personalidade interessante, assim como outras personagens que pareciam inicialmente simplistas. Outras são nitidamente secundárias e nunca desenvolvem uma personalidade muito típica – ainda assim, esta simplicidade e linearidade não se tornam um empecilho na leitura dada a capacidade de mover o enredo.

Diria, no entanto, que o ponto negativo da série é a resolução, ou a forma como o autor decide resolver alguns dos conflitos e ideias principais, afastando a história da conclusão mais óbvia, mas também, terminando-a de forma menos convincente.

Conclusão

Postal é uma das séries mais interessantes dos últimos tempos que não ascende ao patamar do excelente devido a algumas escolhas na direcção narrativa. A história possui um bom ritmo, uma perspectiva peculiar e um desenvolvimento interessante e cativante, conseguindo manter-nos envolvidos sem apelar à empatia do leitor. Ainda assim, é uma leitura aconselhável a quem gosta de uma história carregada de acção e não se importe com violência.