O quinto volume da série de Novelhas Gráficas de 2023 (lançada em Portugal pela Levoir em parceria com o jornal Público) é de autoria Iraniana. Nesta obra, o autor explora a sua própria história enquanto autor de tiras cómicas de jornais, num país onde as piadas podem ter um custo elevado.

Ainda que Mana tenha lançado uma tira cómica inocente, a utilização de uma palavra de origem turca leva a uma interpretação catastrófica (ou oportunista) por determinados grupos étnicos. Acusado de desestabilização, o autor é preso sem julgamento, primeiro para que confesse o crime, depois para fazer dele um exemplo.

A vida de Mana transforma-se num inferno, com sucessivas permanências na prisão e, até, ameaçadas aos seus familiares. Quando vem nova instrução para nova prisão, Mana não aguenta mais e resolve deixar o país com a esposa.

Apesar da gravidade da situação e dos episódios pelos quais passou, o autor mantém-se, neste relato, cómico. As personagens apresentam feições exageradas, por vezes numa caricatura de expressões excessivas. O ambiente é transformado, atribuindo uma metáfora às circunstâncias, uma vertente quase irónica, nalguns momentos, que funciona como uma espécie de afastamento emocional das circunstâncias ou como um distanciamento na narrativa. O desenho é limpo, focando-se no que importa, e conferindo uma perspectiva muito pessoal do autor.

Ainda que o título remeta para Metamorfose de Kafka, há alturas em que parece aludir mais ao livro O processo. Sem julgamento, torturado e metido várias vezes na prisão pelo mesmo cartoon, parece ser impossível afastar-se do crime a que o acusam, com ou sem confissão. Já a tentativa de saída do Irão remete também para uma dificuldade excessiva, um labirinto de papéis e falsificações sem fim, apesar de todas as evidências em como corre perigo de vida.

Focando-se numa sociedade onde a censura prolifera e as interpretações políticas podem ser inesperadas, Uma metamorfose iraniana é uma boa leitura, não só pela perspectiva apresentada, mas pelo humor e ironia que o autor coloca nos desenhos e descrições, resultando numa narrativa interessante e fluída.