Eis o lançamento de uma nova personagem Bonelli no nosso mercado, através da colecção Aleph da editora A Seita, como já tem sido habitual. Esta nova personagem, o Comissário Ricciardi, é um reflexo directo do seu dom, condicionado tanto em profissão como em relacionamentos. O tom é sombrio, quase deprimente.

A história

A primeira história do volume é Dez Cêntimos e leva-nos a um momento determinante na vida do Comissário. Chegado a Nápoles para cursar filosofia, o jovem Ricciardi rapidamente se apercebe da violência que rodeia a cidade. Ricciardi é capaz de ver os mortos, sobretudo aqueles que morreram de forma violenta. Estes fantasmas repetem incessantemente as suas últimas palavras.

Neste caso concreto, trata-se de uma jovem rapariga que vende flores. O seu fantasma leva Ricciardi a questionar-se sobre as razões da morte da rapariga e leva-o a procurar as circunstâncias em que tal decorreu. Este caso será determinante na decisão de carreira, afastando-o da filosofia.

A segunda história, de título Os Vivos e os Mortos, leva o Comissário Ricciardi a explorar uma série de mortes na cidade, entre prostíbulos e casa religiosas. Uma estranha combinação que levará o Comissário a descobrir uma rede poderosa na cidade.

Mammarella (a terceira história) leva Ricciardi novamente a um bordel, mas desta vez a vítima é uma famosa prostituta. Estando a jovem reservada para um pequeno bandido local, o acesso à jovem é bastante limitado.

Crítica

O Comissário Ricciardi é caracterizado pelo dom de ver os fantasmas dos mortos, sobretudo daqueles que faleceram em circunstâncias violentas. Este dom, herdado da mãe, acompanha-o desde muito cedo, e fez com que tenha sido identificado pelos colegas como estranho. Não é, portanto, um homem de muitos amigos. Nem sequer é um homem capaz de ultrapassar as suas limitações sociais para estabelecer contactos românticos. É, sobretudo, uma personagem eternamente assombrada pela violência que o rodeia.

Esta caracterização da personagem, leva-nos a ver o pior da humanidade em cada história, com personagens a serem corrompidas pelos seus desejos e paixões das formas mais sórdidas e violentas. A visão é, sobretudo, negativa, sombria e deprimente – algo que partilhamos com a personagem principal, percebendo-se assim a forma como se relaciona com os que o rodeiam.

Foi-se impossível não estabelecer algum paralelismo com Dylan Dog, mas enquanto Dylan Dog procura, em cada amante, a perfeição da mulher perdida, envolvendo-se em grandes aventuras e caindo sucessivamente no vício, o Comissário Ricciardi mostra-se bastante mais disciplinado e regrado, ainda que esta rigidez advenha do som que o assombra desde sempre. Apesar do seu dom, as histórias possuem poucos elementos sobrenaturais ou fantásticos, mostrando as pistas que o Comissário persegue para descobrir o enredo por detrás dos crimes.

Conclusão

Este Comissário Ricciardi surpreendeu pela positiva. Gostei das histórias, curtas, de resolução rápida, bem como do tom sombrio e pouco esperançado dos finais. A narrativa é mais do que competente, tanto pela caracterização de personagens como pela forma como usa a acção para mover a história. A par com tudo isto, a edição (de cada dura) apresenta textos complementares e páginas introdutórias a cada história que ajudam a ganhar interesse pela narrativa.