Pedro Cipriano é conhecido no meio da ficção especulativa como o editor da Editorial Divergência, o responsável pela Convergência ou como escritor de histórias de ficção científica e fantástico, participando em diversos projectos de publicação portuguesa e ganhando alguns dos prémios para obras de ficção especulativa que existem em Portugal.

A Menina dos Doces é uma obra diferente do que lhe é usual, publicada por uma editora recente no mercado – Edições Velha Lenda. Sem elementos fantásticos, e baseada em factos reais, a história centra-se numa jovem, a Mariana, que, tendo ido estudar para Aveiro, longe dos pais, habita a casa abandonada do tio. Entre as arrumações e as limpezas da habitação descobre que teve uma prima!

A descoberta irá aguçar-lhe a curiosidade mas será, também, a causa para desentendimento com a família que não lhe pretende dar pormenores sobre o que realmente se passou. Fala-se de uma doença repentina, sem grandes detalhes, como forma de tentar ultrapassar o assunto. Ao invés de o esquecer, Mariana irá ler todas as cartas que encontra na casa, bem como um diário da falecida prima, procurando perceber o que se passou.

Em A Menina dos Doces, a narrativa centra-se sobretudo na jovem Mariana, oscilando a perspectiva desta personagem com a da prima, expressa através do diário e das cartas que deixou. Na narrativa principal destaca-se a grande utilização de diálogos, algo que, em muitos textos de autoria portuguesa soa a falso (sobretudo pela utilização de palavras pouco comuns) mas que, aqui, funciona quase sempre bem, conferindo fluidez e dinamismo ao texto.

Em termos de história estamos perante um texto que se pode caracterizar quase como young adult, não só por se centrar numa jovem universitária, mas por apresentar a sua vivência no primeiro ano de faculdade – a vivência fora de casa dos pais, as suas esperanças para o curso, novas amizades que a levam por caminhos diferentes, um namoro inesperado. Mariana é uma jovem responsável, pouco habituada à rédea solta de que agora usufrui.

A história toca, ligeiramente, nos relacionamentos tóxicos, quer sejam namoros ou amizades – algo com que Mariana nem sempre é capaz de lidar bem (e com algumas consequências na sua vida) mas que é resolvido ao longo da história. Não existe tentativa de normalização deste tipo de relacionamento, sentindo-se a aura de desconforto que costuma advir deste tipo de interacções. Ainda que esta abordagem não seja central na história, é um elemento interessante para alertar para este tipo de relacionamentos.

Para além deste nível narrativo, o mistério em torno da morte da prima confere um objectivo à personagem principal, um foco de interesse, que permite justificar a continuação da história. Resolvido o mistério (no final) e derivado o respectivo impacto da descoberta, a narrativa encerra-se, de forma contida, sem excessos nem prolongamentos desnecessários.

A Menina dos Doces não pertence aos géneros que costumo ler. Não possui elementos de ficção especulativa nem se pode enquadrar na secção de Não Ficção. Ainda assim é uma leitura agradável que consegue envolver de forma competente, destacando-se pela utilização proveitosa de diálogos.