
Eis um livro com um conceito interessante e original: um andróide com aparência humana tem como objectivo conseguir fazer-se passar por humano. A história é contada pelo próprio, em formato diário, intercalando o relato dos acontecimentos com guias analisando a sociedade e o comportamento humanos.
A história
O andróide acorda um dia, pelas mãos de um técnico, com uma missão simples – fazer-se passar por humano. Aquilo que começa como um emprego banal e uma existência linear sofre graves alterações quando o andróide conhece uma humana com a qual encontra pontos em comuns. A humana, uma pessoa com excessivas qualidades analíticas, surpreende-se pela honestidade e frontalidade deste homem peculiar.
A história ganha velocidade quando, um dia num casino, par se vê perseguido por um grupo de homens de negro que parecem querer raptar o andróide. Convicto de que a peça do puzzle estará com o criador do andróide, este decide-se a procurar o pai. A partir daqui os episódios sucedem-se com maior velocidade.
A narrativa
A história é contada na perspectiva do andróide que acredita estar no fim das suas baterias (desconhecendo como voltar a carregá-las). Assim se justifica a criação do diário, onde deixa as suas experiências e observações como forma de poupar tempo a um suposto sucessor (outro andróide que passará pela mesma experiência).
Intercalando estas memórias, o andróide coloca o resultado de várias observações e investigações que terão, também, como objectivo, adaptar um comportamento mais humano. Assim se criam estatísticas e conclusões sobre habitat (a forma como o lixo e o caos se acumulam nas casas, bem como as funções de cada área ou decoração), diferenças entre géneros (vantagens de cada um, facilidades e dificuldades na simulação), a relação com o trabalho, hábitos reprodutivos ou sobre a religião.
Cada um destes estudos consegue produzir conclusões irónicas, mas proferidas num modo neutro, onde se destacam as incoerências da espécie humana. Algumas destas conclusões são associadas a vantagens evolutivas. Outras não se compreendem, mas aí o andróide resume-se a compilar o comportamento para adopção futura.
How to pass as human é uma história ilustrada (apesar de ter sido publicada pela Dark Horse) que intercala texto com imagens. As figuras são de dois tipos: intercalam a componente de diário, mostrando o andróide nas várias etapas da sua aventura; ou ilustram os relatórios de observação com gráficos e imagens exemplificativas, tendo um formato mais neutro.
A história acicata a a curiosidade. O conceito é estranho e é explorado de forma pouco exaustiva, intercalando as duas componentes. Os episódios retratados pelo andróides são apenas os mais simplificativos ou movimentados fazendo com que esta parte seja movimentada. Ainda assim, ocupa menos espaço do que a parte dos estudos ou observações, sendo que gostaria de a ver um pouco mais predominante. Retirando a parte dos estudos, a história é relativamente simples e linear.
No entanto, as duas componentes trabalham bem, usando-se a história de um andróide para falar sobre a espécie humana, as suas incoerências e como alguns dos seus hábitos derivam de selecção natural que beneficiava algumas características que actualmente já não fazem grande sentido.
Conclusão
How to pass as human é uma boa leitura, bem humorada e movimentada que consegue manter-se interessante pela forma como explora a caracterização da sociedade humana e o comportamento humano. Gostaria que a parte da história fosse um pouco maior, mas gostei dos estudos apresentados e das conclusões curiosas que as acompanham.
Acho, no entanto, que poderá ser uma leitura que não agradará a todos. Se se aborrecem a ver gráficos, exposição de argumentos lógicos e conclusões semi científicas, provavelmente vão achar que esta componente é demasiado secante, e que, sem ela, o resto é insuficiente para cativar. Eu, no entanto, gostei bastante.