Eis um livro que, pelo menos para mim, apareceu como surpresa no mercado português. O título era curioso, mas não sabia bem o que esperar, percebendo apenas que se tratava da adaptação de um romance. Mas o que encontrei enquadra-se entre as melhores leituras do mês, senão dos últimos meses – e claro que o tema ajuda nessa classificação.

A história começa por nos apresentar um jovem que auspicia ser escritor. Começa por palestras com escritores, mas percebe rapidamente que a abordagem mais académica, onde a narrativa é rebaixada em relação à forma não é aquela que lhe convém. Acaba por ir trabalhar numa pequena livraria numa ilha, também conhecida por ser o local de reclusão de um escritor famoso. Alternadamente, acompanhamos a perspectiva deste misterioso escritor.

Até aqui a narrativa parece centrar-se mais em curiosidades literárias. Mas quando aparece, na mesma ilha, o cadáver de uma mulher, resultado de um assassino com traços de artista, e as deslocações são cortadas, passamos à descoberta de um crime macabro, mas também bastante mais ramificado do que seria de esperar.

Claro que os primeiros momentos da história ressoaram bastante. Quantas vezes não vi já alguns escritores e professores de letras mais académicos exultarem a forma e a escolha das palavras, ao invés da caracterização das personagens, o saber mover a narrativa e o captar de interesse pela leitura? Ainda mais bafienta, a distinção entre o que é reles, e a verdadeira literatura? Ambas as experiências são retratadas pela personagem principal. A par com esta percepção, referem-se e citam-se autores conhecidos como Umberto Eco ou Margaret Atwood.

Todo o vosso trabalho se deve centrar na língua e não na história. A narrativa só ali está para servir a língua. O livro não pode ter outra finalidade que não seja a procura da forma, do ritmo, da harmonia.

Tal como com os escritores que são personagens deste livro (ou melhor, o aspirante a escritor e o que abandonou a profissão), a narrativa é o fundamental, criando-se um enredo com vários elementos e várias acções em paralelo. O escritor é visitado, contra vontade, por uma jovem jornalista que lhe apresenta um mistério associado à jovem assassinada, ao mesmo tempo que se vai descobrindo o verdadeiro motivo pelo qual abandonou o holofote e se isolou na ilha.

A vida secreta dos escritores apresenta-se como um page turner, um livro carregado de mistérios que se torna viciante, ainda que exista um ou outro detalhe que parece transparecer demasiada coincidência. Mas mais do que se apresentar como um thriller, envolve-se de referências literárias, captando e transparecendo a paixão por livros e literatura.