
Sentient é uma das três leituras seguidas da autoria de Jeff Lemire. Trata-se de uma Space Opera movimentada que me surpreendeu pela positiva – é, sem dúvida, a melhor das três leituras de Jeff Lemire!



A história
O Planeta Terra está em declínio. Tendo fundado uma colónia num outro planeta distante, a humanidade envia naves com novas ondas de colonos. Montgomery (designação não inocente) é o nome de mais uma nave que leva algumas famílias para o novo planeta, sendo que cada pessoa a bordo tem uma função essencial para a progressão da missão.
Para além do ambiente apocalíptico que se faz sentir na Terra, o que espera os colonos no novo mundo não é um paraíso – afastados do planeta de origem, na colónia grassa uma onda de descontentamento e de revolta que visa a autonomia de um governo distante e ultrapassado.
Esta divisão política contagia, também, algumas pessoas que se deslocam para o novo mundo, e a tripulação de Montgomery não é excepção. Uma mulher, tendo como objectivo cortar laços com a Terra, instala um vírus na I.A. e liberta um patogéneo mortal que matará, em poucos momentos, todos os adultos. Felizmente, a revolta é contida – mas não sem graves perdas. As crianças vêem-se sem adultos na nave mas com a ajuda da I.A. irão assegurar as funções essenciais à continuidade da viagem.


Crítica
Tal como em Descender ou Sweet Tooth, Jeff Lemire pega em crianças como personagens principais e coloca-as numa situação em que têm de tomar decisões de adultos, protegendo-se e protegendo outros. Mas ao contrário das outras séries, executa a história num único volume, construindo uma história mais objectiva e contida.
Enquanto outros livros seguem a narrativa de O Deus das Moscas e passam a demonstrar a disfuncionalidade dos mais jovens, a história de Jeff Lemire apresenta personagens jovens e inexperientes, mas que se responsabilizam pelas consequências das suas próprias decisões – mas claro que, sendo jovens, as suas decisões nem sempre são as mais acertadas.
Outro ponto em comum com outras narrativas de Jeff Lemire é a existência de uma Inteligência Artificial que parece ultrapassar os limites da sua programação, assumindo um papel de guia (ensinando os mais jovens como efectuar as tarefas na nave) mas também quase de progenitora, tentando proteger as crianças face a ameaças externas.
Apesar da I.A., a viagem não será pacífica, e existirão momentos de elevada tensão e confronto, sobretudo quando as crianças se aventuram num salvamento ou quando a nave encontra outras da colónia. Estes momentos irão recordar histórias clássicas de ficção científica de horror, com consequências na sanidade mental das crianças.
Tudo isto acontece num único volume. Senciente é uma história que consegue ter uma boa e rápida caracterização de personagens (com a apresentação de alguns detalhes como é típico em Jeff Lemire), mas que apresenta uma narrativa ritmada que compila os dramas principais da viagem, cortando ao essencial o contacto ou o quotidiano entre as personagens. O resultado é conciso e objectivo, entregando uma história contida num único volume, mas sem sacrificar a força narrativa dos acontecimentos. O resultado é, pois, excelente.



Conclusão
Senciente é uma das três leituras seguidas que fiz da autoria de Jeff Lemire. É, a meu ver, a melhor das três, apresentando uma narrativa objectiva e directa, que consegue, num curto espaço caracterizar as personagens e envolver-nos, mas que não se demora mais do que é necessário nesta caracterização, entregando sucessivamente momentos de tensão. Existe abertura para algum questionamento (sobre o papel da tecnologia, e sobre o papel dos progenitores) mas que deverá ser explorado ou derivado pelo leitor.