
Este é o primeiro volume da série Armazém Central, já publicada no nosso mercado por outra editora. Os comentários positivos são diversos, mas os volumes são difíceis de encontrar, pelo que este lançamento pela Arte de Autor veio colmatar esta falha. Depois de anos de curiosidade, eis finalmente a leitura!
A história
Armazém Central leva-nos à vida rural de uma vila no interior do Quebec nos anos 20, centrando-se numa jovem mulher, Marie, que ficou viúva, com o armazém central para gerir. Marie é uma jovem prestável que, não tendo nascido nesta vila, se questiona o que aqui a prende. Ainda assim, vai-se safando com dificuldade, tentando conduzir o camião para pegar novas mercadorias, e tentando responder às necessidades da vila.
Ainda que tenha como ponto de partida a morte do marido de Marie, evento que afecta toda a vila, acaba por se centrar em várias outras personagens, demonstrando como interagem, explorando amizades e rivalidades, demonstrando pequenos segredos e defeitos.
Ainda que tenha como ponto de partida a morte do marido de Marie, evento que afecta toda a vila, acaba por se centrar em várias outras personagens, demonstrando como interagem, explorando amizades e rivalidades, demonstrando pequenos segredos e defeitos.
A narrativa
Centrando-se na vida rural de há quase 100 anos, a história é pausada, demonstrando os pequenos eventos que afectam o quotidiano da vila. A história não segue propriamente uma única personagem, nem nos apresenta os seus pensamentos, focando-se, ao invés disso, nas interacções entre os habitantes.
A forma como o faz é amorosa e indirecta – a caracterização das várias personagens deriva da forma como reagem e falam umas com as outras, em situações caricatas ou de alguma urgência. Esta abordagem faz-nos criar ligação com o que decorre e querer voltar a este peculiar estilo de vida. Não faltam as velhas beatas, nem os que fogem à igreja, não faltam os casais que procuram alguma privacidade, nem os rapazes traquinas.
A vida nesta vila rural é semelhante a tantas outras noutros pontos do planeta – o relativo isolamento da localidade leva a que todos saibam os segredos uns dos outros, ou a que todos se metam (ou queiram meter) na vida uns dos outros, mas em contrapartida existe um sentimento de união e de interajuda, necessário numa comunidade como esta. Não faltam, também, os momentos de escaramuça, uma espécie de exorcismo de energias onde se libertam tensões e rivalidades. Mas também não faltam as pequenas urgências do dia a dia, em que os habitantes têm de se unir.
O desenho
A cor é realista e pouco exuberante. Os tons acastanhados e esverdeados dominam as páginas, e mesmo quando existem outras cores, estas são apresentadas num tom sujo e gasto. O desenho também apresenta um tom realista, sobretudo, no que diz respeito às paisagens. Já nas personagens, resvala um pouco para o caricato, tanto nas posturas corporais, como nas expressões faciais, ajudando-nos a perceber o estado de espírito das personagens e a forma como interagem.
Comparação com a edição francesa
O volume da Casterman possui um formato ligeiramente maior, mas a menor ocupação de página leva a que, em termos de conteúdo, os desenhos sejam do mesmo tamanho. Ambas as edições apresentam o mesmo texto introdutório, acompanhado por vinhetas a preto e branco, ainda que existam algumas diferenças no desenho do verso da capa e do primeiro desenho na página interior de resumo técnico. A maior diferença estará no acabamento das páginas e da capa, com uma grossura superior das páginas na edição da Casterman, e uma capa aveludada na edição da Arte de Autor. Denota-se, também, alguma diferença nas cores, com as imagens em Arte de Autor num tom mais avermelhado.
É de realçar, também, que as tentativas de ler a edição francesa foram totalmente frustradas – ainda que o meu nível de francês não seja dos melhores, o texto possui demasiadas expressões idiomáticas e demasiado calão do Quebec para me ser legível.

Conclusão
Este Marie é uma leitura interessante que desperta interesse e envolvência. É excelente em termos visuais e narrativos, conseguindo captar a atenção sem necessidade de recorrer a velocidades estonteantes, mas sim, a pequenos episódios onde se denotam as características das personagens. É, sem dúvida, uma série para seguir!
